Centenas de milhares de pessoas enfrentam dificuldades para obter a nacionalidade italiana, mas o tema não foi abordado durante a campanha para as legislativas.
A obtenção da nacionalidade italiana é uma miragem para muitos estrangeiros que vivem no país. Khaby Lame, que nasceu no Senegal, conseguiu obtê-la graças ao seu sucesso na rede social Tik Tok, mas para centenas de milhares de estrangeiros, que nasceram ou vivem em Itália, desde crianças, o processo continua a ter muitos obstáculos.
O assunto esteve ausente da campanha eleitoral para as eleições legislativas e limita-se à posição da esquerda italiana, que pretende introduzir o direito à cidadania para quem nasceu no país, ius soli, ou para quem frequentou a escola em Itália (tendo chegado antes dos 12 anos e completado um ciclo de estudos de cinco anos), o chamado ius scholae.
Atualmente, existem três formas possíveis de se obter a nacionalidade italiana: se a pessoa em questão for descendente de italianos, se viver no país há pelo menos dez anos e cumprir determinados requisitos ou através do casamento com um cidadão italiano.
No país, há perto de um milhão de pessoas presas em questões burocráticas, que não conseguem obter a nacionalidade e que sofrem uma discriminação severa à conta disso.
Marilena Delli Umuhoza, escritora e jornalista, é uma das poucas que fala sobre o assunto. Ela conta as histórias destas pessoas todas as semanas na Radio Radicale, juntamente com Andrea Billau.
"Entrevistámos a antiga ministra da Integração, Cecil Kyenge. Ela foi a primeira convidada, seguida por Stella Jean, estilista italiano-haitiana que também estará presente na Semana da Moda de Milão. Tivemos ainda como convidada a primeira pintora afro-descendente, Veggetti, e o artista Igiaba Scego", disse Marilena Delli Umhuoza.
Atores, músicos, desportistas... Muitos consideram-se italianos, mas não têm a nacionalidade, apesar de se destacarem nas suas áreas e colocarem Itália no mapa.
"Em Itália, para se merecer algo como a nacionalidade, é preciso destacar-se a todo o custo. A nacionalidade é um direito, por isso é absurdo que a atual lei de cidadania, ius sanguinis, se baseie no direito pelo sangue. Devido a esta lei, quase um milhão de jovens são discriminados e é-lhes negado o direito ao voto", acrescentou a jornalista.
"Eu sou negro, mas sinto-me italiano"
Em Trento, conhecemos Ibrahim, natural do Burkina Faso, que conseguiu obter a nacionalidade italiana, após um processo moroso. A sua pizza está entre as 50 melhores do mundo, no entanto, o caminho nem sempre foi fácil.
"No início, as pessoas não queriam entrar, passavam pela pizzaria, viam que era eu que estava aqui e continuavam a andar. Dei-me ao trabalho de me ausentar, de propósito, durante as horas de ponta. Contratei dois empregados brancos e foi uma reviravolta incrível. Passou a estar cheio e até faziam filas", explicou Ibrahim Songne.
Enquanto espera pela lei da cidadania, Ibrahim ajuda a desmistificar muitos conceitos errados.
"Ser italiano não significa necessariamente ser branco, já que pode ser-se negro e italiano. Eu sou negro, mas sinto-me italiano", rematou.