Mais de um terço dos jovens entre os 18 e os 35 anos é a favor de um regime militar ou de um líder autoritário, de acordo com um estudo da Open Society Foundations
As pessoas ainda acreditam na democracia?
A pergunta foi feita pela Open Society Foundations, que, pelo segundo ano consecutivo, inquiriu mais de 36 mil pessoas em 30 países.
O objetivo foi então conhecer as opiniões dos cidadãos sobre os direitos humanos, a democracia e os principais desafios que os países e o mundo enfrentam.
O inquérito "Barómetro da Open Society: A Democracia é Eficaz?", um dos maiores alguma vez realizados sobre a opinião pública mundial, foi conduzido entre maio e julho de 2023. Os resultados, publicados na véspera do Dia Internacional da Democracia, são surpreendentes.
O conceito de democracia continua a ser muito popular em todas as regiões do mundo: 86% dos inquiridos dizem preferir viver num Estado democrático e 62% acreditam que a democracia é a melhor forma de governo possível.
Além disso, apenas 20% das pessoas acreditam que os Estados autoritários são mais capazes de satisfazer as exigências dos cidadãos e são mais eficientes na resolução dos grandes problemas aos níveis nacional e internacional.
O que é surpreendente, porém, é que, embora a confiança na democracia continue a ser elevada de um modo geral, o grupo etário mais cético quanto à sua eficácia é o mais jovem, com idades entre os 18 e os 35 anos.
Se olharmos para os dados desagregados por faixa etária, a percentagem de cidadãos que consideram a democracia a melhor forma de governo possível desce para 55% entre os mais jovens. Sobre para 61,4% entre os 35 e os 55 anos, e para 69% entre os maiores de 56 anos.
Além disso, 42% dos mais novos consideram que um regime militar é uma boa forma de governar um país e 35% são a favor de um líder "forte" que dispensa eleições e parlamento.
Como chegámos aqui?
"É realmente preocupante que o apoio mais baixo [à democracia] esteja no grupo dos 18 aos 35 anos, porque atualmente temos a maior geração de jovens. Metade da população mundial tem menos de 30 anos", afirma Natalie Samarasinghe, diretora global da Open Society Foundations.
Mas o contexto é importante. "É uma combinação de fatores. Estamos perante uma geração que sofreu uma série de choques: económicos, COVID, alterações climáticas. E está mais do que provado que os Estados autoritários não lidaram bem com estas crises, mas as democracias também não", salienta Samarasinghe.
"Quando se cresce numa era de instabilidade e crises, tem-se pouca confiança nos políticos. Por isso, penso que isto se traduz em ceticismo em relação ao sistema como um todo".
Para além do sentimento de que a política não conseguiu lidar com as grandes crises dos últimos anos, há também a impressão "de que estão pior" do que os seus pais em termos de condições socioeconómicas.
O desinteresse dos jovens pela democracia resulta, portanto, de um desfasamento geral e contínuo entre o que eles exigem e o que é efetivamente realizado pela classe política. Em média, cerca de um terço dos inquiridos não confia nos políticos para servirem os seus interesses e abordarem as questões que lhes interessam, sobretudo a pobreza, a desigualdade, os direitos humanos, as alterações climáticas e a corrupção.
Estará a democracia realmente em risco de extinção?
Nenhum dos especialistas considera que a extinção da democracia seja minimamente possível.
"As democracias continuam a surgir e as já estabelecidas nunca caíram. Na verdade, é errado dizer que existe uma crise da democracia. Existem problemas de funcionamento em algumas democracias, por exemplo na Hungria, na Polónia. Mas a democracia não está em crise", afirma Gianfranco Pasquino, professor honorário de Ciência Política.
Samarasinghe acrescenta: "os valores que as pessoas defendem, incluindo os direitos humanos, estão tão profundamente enraizados, mesmo nos países que têm governos mais autoritários, que não há maneira de desaparecerem".
A preocupação é outra: o que pode acontecer durante este período de desalinhamento. "Penso que os líderes políticos, nacionais e internacionais, têm de ter em mente as consequências da inação".