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Bacalhau pode faltar este Natal em Portugal: saiba porquê

Pedaços de bacalhau seco empilhados são vistos em uma loja de alimentos no centro de Lisboa, quinta-feira, 30 de maio de 2013.
Pedaços de bacalhau seco empilhados são vistos em uma loja de alimentos no centro de Lisboa, quinta-feira, 30 de maio de 2013. Direitos de autor  Francisco Seco/AP
Direitos de autor Francisco Seco/AP
De Ana Filipa Palma
Publicado a Últimas notícias
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O consumo de bacalhau pode estar em risco por causa das sanções económicas aplicadas a Moscovo e redução da quota de pescado. A Rússia é a principal origem mundial de bacalhau.

O consumo de bacalhau pode estar em risco por causa das sanções económicas aplicadas a Moscovo e redução da quota de pescado, uma vez que a Rússia é a principal origem mundial de bacalhau.

Numa reunião com o secretário de Estado das Pescas e do Mar, Salvador Malheiro, a Confederação Portuguesas das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME) apelou ao Governo para que se criasse um regime de exceção no que toca à importação do bacalhau.

Desde o dia 1 de janeiro de 2024 que entraram em vigor as tarifas de 12% , aplicadas pela UE, à importação de bacalhau congelado russo, principal matéria-prima da indústria do bacalhau em Portugal e vieram dificultar a vida à indústria portuguesa.

"A nossa industria até 1 de janeiro de 2024 tinha preferência pela matéria prima de bacalhau congelado russo", explica à Euronews Jorge Carmaneiro, vice-presidente da CPPME e empresário da indústria bacalhoeira.

Isto remonta ainda aos anos 90, quando o Canadá aplicou uma moratória que proibia a pesca comercial do bacalhau na província da Terra Nova e Labrador, onde muitos portugueses trabalharam. "A indústria nessa altura teve de reorganizar o negócio do bacalhau e os portugueses identificaram matéria prima potencial na Rússia. Como não têm os fiordes do Mar do Norte, que a Noruega tem, os russos desenvolveram uma capacidade de congelação a bordo inigualável", explicou Jorge Camarneiro.

Cerca de 90% de todo o bacalhau que Portugal importava para a indústria de transformação era proveniente da Rússia. "Chegava aqui e transformávamos o produtos como quiséssemos: escalado, seco, salgado, ultracongelado", esclarece.

Por ano eram importados dezenas de milhares de toneladas que abasteciam todo o mercado nacional e internacional. "Abastecíamos o mercado do Brasil, mercado CPLP e o mercado da «saudade», dos portugueses que estão pela Europa e nos EUA que procuram muito o bacalhau salgado seco."

As tarifas de 12% vieram dificultar financeiramente a indústria portuguesa, mas como explica Jorge Camarneiro, foram-se "minimizando estragos", contudo, o 17º pacote de sanções à Rússia , adotado a partir de dia 21 de maio deste ano foi a machadada final.

O pacote que teve como alvo principal a "frota fantasma" de petroleiros russos, os seus operadores, bem como um grande produtor russo de petróleo, também visou pessoas singulares, pessoas coletivas e entidades como duas empresas de pesca russas, a Norebo JSC e a Murmam Sea Food.

A Norebo assegura cerca de 60% do bacalhau exportado e, como explica Jorge Camarneiro à euronews, para Portugal era um grande fornecedor .

"A partir de 1 de janeiro, a Murman Sea Food perde importância para nós, porque só tinha bacalhau congelado, e não estava isento de direitos portanto era difícil de comportar. Contudo, a Narebo tinha construído uma fábrica de transformação de bacalhau salgado verde - que é bacalhau que ainda não está seco - começou a ser a nossa solução porque até 25 mil toneladas por ano estava isento de direitos e os industriais portugueses compraram muito produto."

A partir do momento que estas empresas entram na lista de proibição da UE, Portugal ficou sem um importante fornecedor tendo apenas como solução a Noruega e em pequenas dimensões a Islândia, Gronelândia e o Canadá, que o ano passado levantou as proibições de pesca.

Segundo a UE, as duas empresas de pesca russa operavam numa campanha de vigilância patrocinada pelo Estado russo. As embarcações de ambas as empresas foram investigadas ao longo de algum tempo, tendo sido tiradas conclusões posteriores sobre os seus padrões de navegação.

"Estes padrões de navegação estão em consonância com objetivos mal-intencionados, incluindo a presença e o ato de pairar repetidamente na proximidade de infraestruturas críticas e zonas militares. Por conseguinte, estes padrões de navegação foram associados, inclusive pelas autoridades dos Estados-Membros e de países terceiros, à campanha de vigilância patrocinada pelo Estado russo que recorre, nomeadamente, a arrastões de pesca civis para levar a cabo missões de espionagem que visam infraestruturas civis e militares no mar do Norte e no mar Báltico. Essas atividades podem facilitar operações de sabotagem futuras", pode ler-se no comunicado da União Europeia em maio de 2025.

Mas o bacalhau português não vem da Noruega?

Os países com a maior quota de pesca de bacalhau do mundo são a Noruega, a Rússia e a Islândia.

Como explicou à Euronews, o vice-presidente da CCPME, Jorge Camarneiro, "o bacalhau que chega a Portugal é pescado no Mar de Barens, onde as quotas de pesca são divididas entre a Noruega e a Rússia em 50% cada uma."

Não sendo a Noruega membro da União Europeia, não aplicou as sanções aos dois armadores russos e, por isso, continua a negociar com as empresas russas. "Os industriais norueguesas compram a matéria prima russa, transformam e vendem ao preço que quiserem. E nós agora compramos maioritariamente aos noruegueses, é nesta dependência que nos encontramos", diz.

Assim, a CCPME pediu ao Governo que não permitisse “que as condições de compra de bacalhau russo para as empresas portuguesas sejam muito mais desvantajosas do que as das empresas norueguesas”, uma vez que estas depois conseguem colocar o bacalhau em Portugal “a preços incomportáveis para a maioria das carteiras dos portugueses, num movimento de concorrência desleal para todo o mercado”, alerta.

"A Rússia tem navios de maior porte onde pescam, descabeçam, limpam e congelam a bordo, daí a importância da quota russa para Portugal. São os únicos que têm matéria prima para os portugueses. Ninguém tem os barcos de congelação, nem a capacidade de fazer isto que os russos fazem”, explica.

Por isso pedem ao Governo o regime de exeção que , segundo Jorge, "se muitos países têm regimes de exceção em relação ao petróleo-gás, e há muitas origens, no caso do bacalhau não", diz.

A situação "está a pôr em risco toda a indústria do bacalhau, estão centenas de postos de trabalho em causa; há uma concorrência desleal e o bacalhau faz parte da identidade nacional e cultural do país", afirma.

Jorge Carmaneiro diz que o secretário de Estado das Pescas e do Mar pareceu "genuinamente preocupado com a situação" e comprometeu-se com a delegação da Confederação a levar o assunto a Conselho de Ministros.

O que vai acontecer ao consumo de bacalhau em Portugal?

Segundo o comunicado, as sanções económicas à Rússia fizeram disparar em mais de 50% o preço do bacalhau, nos últimos 3 anos e segundo contas da Deco Proteste, 50 euros já só chegam para comprar 3 quilos de bacalhau.

Para Jorge Camarneiro o bacalhau vai passar a ser o "bife da vazia" das carnes, em que os portugueses vão optar por subprodutos mais baratos. "Vai transformar-se num produto premium que não será acessível para todo os portugueses", diz.

“Os portugueses comuns vão optar por cortes mais humildes como os da caldeirada; postas mais finas ou badanas", exemplifica.

Importa recordar que faltam pouco mais de dois meses para o Natal, período em que o bacalhau, tradicionalmente, regista um acréscimo de preço devido ao aumento da procura. E tendo em conta a atual tendência de subida dos preços, é expectável que este efeito se faça sentir de forma ainda mais acentuada este ano.

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