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Acordo de Paris: 10 anos depois, aquecimento ultrapassa ação global

François Hollande (à direita), Laurent Fabius (segundo à direita), Christiana Figueres (à esquerda) e Ban Ki-moon levantam as mãos em celebração no final da COP21, em 2015
François Hollande, à direita, Laurent Fabius, segundo à direita, Christiana Figueres, à esquerda, e Ban Ki-moon erguem os braços no final da COP21, em 2015. Direitos de autor  AP Photo/Francois Mori, File
Direitos de autor AP Photo/Francois Mori, File
De SETH BORENSTEIN com AP
Publicado a Últimas notícias
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Ondas de calor recorde e desastres meteorológicos mortais pontuaram uma década de metas climáticas sucessivamente incumpridas.

O mundo mudou profundamente na última década, desde que os líderes celebraram, em Paris, um acordo climático histórico. Mas não exatamente da forma esperada ou desejada.

O aquecimento do planeta agravou-se mais depressa do que a sociedade conseguiu afastar-se da queima de carvão, petróleo e gás natural, que emitem carbono e alimentam o aquecimento global, disseram vários cientistas e responsáveis.

Há progressos: mais de um grau Celsius foi retirado às projeções de aquecimento futuro desde 2015, mas a insuficiência desses avanços será foco nos próximos quinze dias, com diplomatas reunidos em Belém, Brasil, para negociações anuais das Nações Unidas sobre o clima.

“Importa sermos honestos com o mundo e declarar o fracasso”, disse Johan Rockstrom, diretor do Instituto Potsdam para a Investigação Climática, na Alemanha. Referiu que os impactos do aquecimento estão a ocorrer mais depressa e de forma mais grave do que os cientistas previram.

Mas os diplomatas não desistem.

“Estamos, de facto, na direção definida em Paris, a uma velocidade que nenhum de nós podia prever”, disse a ex-responsável da ONU para o clima, Christiana Figueres, que ajudou a conduzir esse acordo, que exige que os países apresentem planos para combater o aquecimento.

Mas a velocidade do esforço de combate às alterações climáticas é inferior à aceleração dos impactos do clima, acrescentou, o que significa que “o fosso entre o progresso que vemos no terreno e onde devíamos estar continua a existir e a alargar-se”.

A diretora-executiva do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, Inger Andersen, disse que o mundo está “claramente a ficar para trás”.

“Estamos, de certo modo, a serrar o ramo em que estamos sentados”, afirmou.

Sinais de perigo

A temperatura média anual do planeta subiu cerca de 0,46 ºC desde 2015, uma das maiores subidas em 10 anos de que há registo, segundo dados do serviço climático europeu Copernicus. Este ano será o segundo ou o terceiro mais quente de sempre, calculou o Copernicus. Todos os anos desde 2015 foram mais quentes do que o ano do acordo de Paris.

Ondas de calor mortais atingiram não só zonas tradicionalmente quentes, como a Índia e o Médio Oriente, mas também regiões mais temperadas, como o Noroeste do Pacífico, na América do Norte, e a Sibéria, na Rússia.

O planeta tem sido repetidamente atingido por fenómenos meteorológicos mais caros, perigosos e extremos. A década desde 2015 registou o maior número de furacões atlânticos de categoria 5 e o maior número de desastres meteorológicos de mil milhões de dólares nos Estados Unidos, de acordo com registos da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA na sigla original).

Os EUA foram atingidos por 193 desastres que custaram pelo menos mil milhões de dólares (864 milhões de euros) na última década.

Já os incêndios florestais consumiram zonas do Havai, Califórnia, Europa e Austrália. Cheias devastaram áreas do Paquistão, China e Sul dos Estados Unidos. E muitos desses eventos, embora nem todos, têm a marca das alterações climáticas provocadas pelo homem, calcularam cientistas.

Equipas de bombeiros monitorizam o incêndio Palisades em Mandeville Canyon, a 11 de janeiro de 2025, em Los Angeles.
Equipas de bombeiros monitorizam o incêndio Palisades em Mandeville Canyon, a 11 de janeiro de 2025, em Los Angeles. AP Photo/Jae C. Hong, File

Desde 2015, mais de 7 biliões de toneladas de gelo em glaciares e mantos de gelo da Gronelândia e da Antártida desapareceram, calculam os especialistas. Isso equivale a mais de 19 milhões de edifícios do Empire State.

Também a subida do nível do mar está a acelerar.Na última década, os mares subiram 40 milímetros. Pode não parecer muito, mas equivale a água suficiente para encher 30 lagos do tamanho do Lago Erie, segundo Steve Nerem, professor na Universidade do Colorado, que investiga a subida do nível do mar.

Até a Amazónia, onde se vão realizar as negociações climáticas, passou de região que ajuda a salvar o planeta ao absorver gases com efeito de estufa para, devido à desflorestação, por vezes os emitir.

Progresso na inversão da curva

Há também muito a celebrar nos últimos 10 anos.

A energia renovável é hoje mais barata, na maioria dos lugares, do que carvão, petróleo e gás natural poluentes. No ano passado, 74% do crescimento da eletricidade gerada à escala mundial veio de fontes eólica, solar e outras opções verdes, segundo dois relatórios da ONU, de julho.

Em 2015, venderam-se meio milhão de veículos elétricos a nível mundial; no ano passado foram 17 milhões, indica o relatório.

“Isto já não pára”, disse Todd Stern, ex-enviado especial dos EUA para o clima, que ajudou a negociar o Acordo de Paris. “Não se consegue travar as marés”.

Uma central solar flutuante opera no Reservatório Billings, em São Paulo, quinta-feira, 6 de novembro de 2025.
Uma central solar flutuante opera no Reservatório Billings, em São Paulo, quinta-feira, 6 de novembro de 2025. AP Photo/Andre Penner

Em 2015, projeções da ONU indicavam que o planeta estava a caminho de quase 4 ºC de aquecimento desde meados do século XIX. Agora, o mundo está a caminho de 2,8 ºC, talvez um pouco menos se os países cumprirem o que prometem.

Mas está longe da meta de limitar o aquecimento a 1,5 ºC, nível que relatórios científicos consideram a linha de perigo e que se tornou o objetivo central do Acordo de Paris.

“Há dez anos, tínhamos um percurso mais ordenado para afastar totalmente os 1,5 ºC”, disse Rockstrom. “Passaram-se dez anos. Falhámos.”

Um relatório que avaliou dezenas de indicadores de progresso (como instalações de energia solar e eólica) na transição a partir de uma economia fóssil concluiu que nenhum está no ritmo necessário para manter o aquecimento nos 1,5 ºC ou abaixo.

O relatório, da Bezos Earth Fund, Climate Analytics, Climate High-Level Champions, ClimateWorks Foundation e World Resources Institute, concluiu que 35 estão pelo menos a ir na direção certa, embora demasiado devagar.

“Tecnologias que antes eram hipotéticas estão agora a tornar-se realidade. E a boa notícia é que a realidade ultrapassou muitas das projeções de há uma década”, disse Kelly Levin, autora do relatório e responsável por ciência e dados na Bezos Earth Fund. “Mas não é, de todo, suficientemente rápido para o que é preciso”.

Poluição continua a crescer

Os níveis de metano na atmosfera aumentaram 5,2% entre 2015 e 2024, enquanto os de dióxido de carbono subiram 5,8% no mesmo período, segundo dados da NOAA.

Vários países desenvolvidos, incluindo os Estados Unidos e o resto do mundo desenvolvido, reduziram em cerca de 7% as emissões de dióxido de carbono desde 2015, mas noutros países as emissões dispararam: na China subiram 15,5% e na Índia 26,7%, segundo dados do Global Carbon Project.

A Oxfam International analisou as emissões globais por nível de rendimento e concluiu que os 0,1% mais ricos aumentaram as suas emissões de carbono em 3% desde 2015. Os 10% mais pobres reduziram-nas em 30%.

“O próprio Acordo de Paris ficou aquém”, disse Joanna Depledge, historiadora das negociações climáticas da Universidade de Cambridge, em Inglaterra.

“Infelizmente, é uma dessas situações de copo meio cheio, meio vazio em que não se pode dizer que falhou. Mas também não se pode dizer que tenha tido um sucesso dramático”.

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