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O que explica o aumento dos protestos na Turquia após a detenção do autarca de Istambul?

Um manifestante segura uma bandeira turca enquanto a polícia de choque monta guarda durante um protesto contra a detenção do presidente da câmara de Istambul, Ekrem Imamoglu.
Um manifestante segura uma bandeira turca enquanto a polícia de choque monta guarda durante um protesto contra a detenção do presidente da câmara de Istambul, Ekrem Imamoglu. Direitos de autor  Emrah Gurel/AP
Direitos de autor Emrah Gurel/AP
De Mared Gwyn Jones
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A indignação face à detenção de Ekrem İmamoğlu deu origem aos protestos mais violentos na Turquia em mais de uma década.

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As manifestações em massa multiplicaram-se na Turquia durante o fim de semana, depois de o presidente da Câmara de Istambul, Ekrem İmamoğlu - amplamente considerado o mais feroz rival político do presidente Recep Tayyip Erdogan - ter sido detido, encarcerado e acusado de corrupção.

Dezenas de milhares de pessoas desafiaram uma proibição da realização de protestos durante quatro dias e saíram às ruas, tendo sido registados confrontos entre manifestantes e a polícia de choque turca.

Pelo menos 1.133 manifestantes foram detidos, de acordo com o Ministério do Interior da Turquia, ao passo que 123 polícias ficaram feridos.

İmamoğlu foi detido pela primeira vez na passada quarta-feira.

Foi depois, novamente, detido e encarcerado, no domingo, e formalmente acusado de corrupção. O autarca insiste que as alegações contra ele apresentadas têm motivações políticas.

A detenção de İmamoğlu ocorreu precisamente enquanto decorria o escrutínio para o eleger como candidato presidencial do Partido Republicano do Povo (CHP), o mais antigo partido político da Turquia.

O partido CHP afirmou, na segunda-feira, que cerca de 15 milhões de pessoas tinham votado em İmamoğlu, num escrutínio que, pela primeira vez, foi aberto ao público em geral.

Estes números, no entanto, não foram verificados de forma independente.

Embora a detenção não o impeça de concorrer às próximas eleições presidenciais de 2028, ficará impedido de exercer cargos políticos se for condenado pelas acusações de corrupção que lhe são imputadas.

Quem é Ekrem İmamoğlu e porque é que a sua detenção desencadeou manifestações?

İmamoğlu é uma figura popular e líder do Partido Republicano do Povo (CHP) e é presidente da câmara de Istambul desde 2019.

O CHP é o partido mais antigo da Turquia, fundado por Mustafa Kemal Atatürk.

İmamoğlu, agora com 54 anos, manteve dramaticamente o seu papel como autarca de Istambul nas eleições municipais do ano passado com uma vitória com larga margem, já que o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan, atualmente no poder, sofreu grandes perdas em importantes campos de batalha urbanos.

É considerado a maior ameaça ao governo de duas décadas do presidente Erdogan.

Os estudantes universitários lideraram os protestos contra as suas detenções, o que indica um forte apoio entre os jovens eleitores.

Erdogan, que já cumpriu três mandatos como presidente, não pode recandidatar-se a menos que altere a Constituição da Turquia.

As próximas eleições presidenciais deverão realizar-se em 2028.

Estudantes protestam contra a detenção do presidente da Câmara de Istambul. No cartaz lê-se, em turco: “Não nos curvamos nem perante o poder, nem perante a ilegalidade."
Estudantes protestam contra a detenção do presidente da Câmara de Istambul. No cartaz lê-se, em turco: “Não nos curvamos nem perante o poder, nem perante a ilegalidade." AP Photo

"Penso que os protestos são, de certa forma, sobre İmamoğlu, mas também uma resistência [...] a que o acordo autoritário evolua para algo diferente daquilo que os turcos aceitaram", referiu Aslı Aydıntaşbaş, membro sénior associado de políticas do Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), num podcast na segunda-feira.

Em declarações à Euronews, Demir Murat Seyrek, professor adjunto da Brussels School of Governance, afirmou que Ekrem İmamoğlu se tornou "um símbolo da democracia na Turquia".

"Havia uma grande esperança, especialmente entre os jovens, de que ele fosse o próximo presidente da Turquia e que a democracia voltasse, os direitos e liberdades fundamentais fossem restabelecidos", explicou Seyrek.

"İmamoğlu tornou-se um símbolo do medo das pessoas relativamente a um maior autoritarismo na Turquia".

Quais são as acusações?

Um tribunal informou, no domingo, que İmamoğlu tinha sido detido enquanto aguarda julgamento como parte de uma investigação de "corrupção".

De acordo com a AP, o Ministério Público turco descreveu as acusações como sendo de gestão de uma organização criminosa, aceitação de subornos, extorsão, registo ilegal de dados pessoais e fraude em concursos.

Um requerimento anterior para a sua detenção por motivos relacionados com terrorismo foi rejeitado. O Ministério Público tinha-o acusado de ajudar o Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, considerado uma organização terrorista pela União Europeia e por outros governos ocidentais.

A sua detenção foi descrita como se tratando de um “ataque à democracia” pelos ministérios dos Negócios Estrangeiros francês e alemão.

O diploma universitário de İmamoğlu - um pré-requisito para o exercício de cargos públicos na Turquia - foi também revogado na semana passada, naquilo que os seus apoiantes dizem ser um claro esforço para incapacitar politicamente o mais formidável rival do presidente Recep Tayyip Erdogan.

A Universidade de Istambul declarou que o diploma seria anulado por ter sido transferido de outra universidade em Chipre durante os estudos.

Quem mais foi detido?

İmamoğlu foi detido na quarta-feira passada, juntamente com cerca de 100 outros políticos, jornalistas e ativistas.

Um sindicato de jornalistas informou que pelo menos mais oito profissionais desse setor também foram detidos nas suas habitações, na segunda-feira. Entre eles, um fotojornalista que trabalha para a agência noticiosa francesa Agence France-Presse (AFP).

Polícia de choque usa gás pimenta para afastar um manifestante durante um protesto contra a detenção e prisão de Ekrem Imamoglu, em Istambul, Turquia, no domingo.
Polícia de choque usa gás pimenta para afastar um manifestante durante um protesto contra a detenção e prisão de Ekrem Imamoglu, em Istambul, Turquia, no domingo. AP Photo

Em resposta às detenções e à repressão dos manifestantes, um porta-voz da UE instou o governo turco a "defender os valores democráticos".

Porque é que os protestos são considerados potencialmente cruciais para a Turquia?

Não é a primeira vez que ocorrem protestos intensos contra o governo durante o mandato de Erdogan. Em 2013, uma onda de manifestações foi desencadeada pelos planos de desenvolvimento do Parque Taksim Gezi, em Istambul, também conhecidas como os protestos de Gezi.

Mas Demir Murat Seyrek, da Brussels School of Governance, disse à Euronews que estes protestos surgem numa altura sensível para o partido AK, de Erdogan.

“Desta vez, os protestos são puramente políticos e têm a ver com o futuro da democracia na Turquia”, explicou. “O partido AK não está tão forte como naquela altura [durante os protestos de Gezi]. Isto está a acontecer porque eles realmente vêem que podem perder [nas próximas eleições].”

A desinformação está a circular?

Os protestos também desencadearam uma onda de desinformação nas plataformas "online".

Um vídeo que mostra uma procissão noturna tem sido amplamente partilhado nas redes sociais, alegando mostrar as recentes manifestações de apoio a İmamoğlu.

Mas uma pesquisa reversa por imagens permite concluir que o vídeo em questão exibe, na verdade, pessoas reunidas para ver o Papa durante a sua visita a Timor-Leste em setembro passado.

Outro vídeo, detetado pela primeira vez pela organização turca de verificação de factos Teyit, alega mostrar o presidente do partido CHP de İmamoğlu, Özgür Özel, a reunir uma multidão de manifestantes e a encorajá-los a entrar em confronto violento com a polícia.

A Euronews verificou o discurso de Özel e descobriu que este tinha sido cortado de forma enganosa no vídeo analisado, de modo a retirar as suas palavras do contexto. Na realidade, Özel exortou a multidão a usar o “bom senso” e a recorrer a métodos “justos” para exigir justiça.

Na segunda-feira, a rede social X, propriedade de Elon Musk, emitiu um comunicado afirmando que "se opunha" às “múltiplas ordens judiciais” da autoridade nacional de telecomunicações turca para bloquear as contas no X de mais de 700 meios de comunicação social, jornalistas, figuras políticas, estudantes e outros na Turquia.

O comunicado surge na sequência de relatos que davam conta de que várias figuras da oposição que organizaram as manifestações teriam visto as suas contas no X suspensas.

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