Le Pen prometeu esgotar todas as vias legais para anular a sua proibição de exercer funções públicas durante cinco anos. Em que ponto se encontram os esforços para recorrer da sentença?
A líder da extrema-direita francesa, Marine Le Pen, afirmou narede social X que foi rejeitado o recurso apresentado contra uma condenação que a impede de concorrer às eleições presidenciais de 2027.
Em março, a juíza Bénédicte de Perthuis condenou Le Pen a uma pena de cinco anos de proibição de exercer cargos públicos, com efeitos imediatos, depois de ter considerado que ela estava "no centro" de um esquema de desvio de fundos do Parlamento Europeu.
O Tribunal Penal de Paris condenou-a também a quatro anos de prisão - dois anos suspensos e dois a cumprir com pulseira eletrónica - e a uma multa de 100 000 euros. Le Pen descreveu o veredito como uma "caça às bruxas política" e declarou que iria esgotar todas as vias legais para o anular.
Uma publicação amplamente partilhada, que já acumulou mais de 600.000 visualizações, afirma que o seu recurso já foi negado, que o "povo francês está indignado" e que a "UE está por detrás" da rejeição.
Mas qual é, de facto, a posição de Le Pen e será que alguma das afirmações da publicação é correta?
Recurso de Le Pen foi rejeitado?
Essencialmente, para tentar anular a sua proibição presidencial o mais rapidamente possível, Le Pen lançou dois recursos separados pelas vias administrativa e penal francesas.
A 15 de outubro, o Conselho de Estado - o mais alto tribunal administrativo francês - rejeitou um recurso interposto por Le Pen contra as regras eleitorais do país.
É a esta contestação administrativa que a publicação provavelmente se refere. Como já aconteceu há algumas semanas, não é uma notícia de última hora, e é também independente do recurso contra a sua condenação penal de inelegibilidade, que ainda não foi julgado.
O recurso administrativo dizia respeito à retirada de Le Pen da lista eleitoral do departamento de Pas-de-Calais, pela qual é deputada.
"Uma vez que deparou com uma barreira nos tribunais penais, Le Pen tentou um caminho secundário: levar o seu caso aos tribunais administrativos", disse ao The Cube Camille Aynès, especialista em direito constitucional da Universidade de Paris Nanterre.
"Porquê ir por essa via? Não foi propriamente para recuperar o seu lugar no conselho. O verdadeiro objetivo era estratégico - criar um caso que lhe permitisse levantar uma 'questão prioritária de constitucionalidade' (QPC)", disse. "Trata-se de um mecanismo francês especial que permite a alguém, num processo judicial, perguntar se a lei aplicada no seu caso viola a Constituição."
Em última análise, o Conselho de Estado recusou-se a dar seguimento à sua contestação. De acordo com o tribunal, as disposições penais que Le Pen contestava não existiam ou não estavam relacionadas.
"As disposições penais que ela contestava nem sequer se aplicavam a este litígio administrativo", declarou Aynès ao The Cube. "Por outras palavras, não se tratava de um recurso da sua condenação penal".
O principal impacto da rejeição do tribunal do Conselho de Estado é o facto de Le Pen ter perdido a oportunidade de ver a questão revista rapidamente, em vez de esperar meses pelo julgamento do recurso.
É uma questão que ela terá querido resolver rapidamente no meio da agitação política em França - se o presidente francês Emmanuel Macron convocasse eleições presidenciais antecipadas, estas poderiam ter lugar antes da decisão do recurso criminal de Le Pen, deixando-a impossibilitada de se candidatar, qualquer que fosse o resultado subsequente.
Recursos ainda por chegar
Apesar das alegações feitas por utilizadores online de que o seu recurso foi negado, Le Pen está a lançar um recurso separado e maior contra a sua condenação criminal - cujo resultado está longe de estar decidido. Foi agendado um julgamento entre 13 de janeiro e 12 de fevereiro do próximo ano.
Espera-se que o veredito do julgamento seja proferido antes do verão, o que permitiria a Le Pen candidatar-se às eleições presidenciais de 2027, desde que a sua sentença seja anulada ou reduzida.
"O Conselho de Estado ainda tem de se pronunciar sobre um outro processo de CPQ que Le Pen apresentou por causa da sua destituição como conselheira regional - mas os especialistas esperam que o resultado seja o mesmo: não haverá recurso para o Conselho Constitucional", disse Aynès ao The Cube.
Em julho, Le Pen solicitou também uma medida provisória ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem - um tribunal com sede em Estrasburgo que interpreta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem - para anular a aplicação imediata da sua proibição de entrada no país durante cinco anos. O seu pedido foi recusado.
"Nesta altura, só o recurso criminal pode mudar as coisas", disse Aynès. "Se a sentença for confirmada, ela pode recorrer ao Tribunal de Cassação [o supremo tribunal francês para casos civis e criminais]."
A culpa é da União Europeia?
Quanto às afirmações de que "a UE está por detrás" da proibição de Le Pen, também estão erradas: o caso e a condenação estão inteiramente sob a alçada da justiça francesa.
Os pormenores do caso remontam à altura em que Le Pen era eurodeputada. Os procuradores dizem que, entre 2004 e 2016, Le Pen e vários membros do seu partido desviaram fundos destinados a pagar assistentes parlamentares para financiar atividades do partido em França.
De acordo com Aynès, os atos ilícitos só pararam porque o Parlamento Europeu denunciou o caso.
"É o único sentido em que se pode dizer que a UE esteve 'envolvida' - alertou os procuradores", afirmou.
Narrativas semelhantes que confundem o papel da União Europeia nos tribunais nacionais foram repetidas nas redes sociais depois de o candidato presidencial romeno Călin Georgescu ter sido proibido de concorrer às eleições presidenciais do país pelo Tribunal Constitucional.
Apesar dos seus problemas legais, Le Pen e o Rassemblement National (RN) continuam a ser populares, pelo que essa parte da publicação do X é verdadeira. Na altura da sua condenação, uma sondagem do Ifop Opinion colocava-a com 37%. Sondagens mais recentes colocam-na a ela e ao presidente do RN, Jordan Bardella, entre 33 e 37%, à frente dos seus rivais políticos.
Outras afirmações de que Bardella irá concorrer pelo seu partido como candidato presidencial também não foram confirmadas, apesar de o jovem de 30 anos ter o apoio expresso de Le Pen. O RN não respondeu ao pedido do The Cube para comentar o assunto até ao momento da publicação desta notícia.