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Haverá um caça europeu que possa acabar com a dependência dos EUA e dos F-35?

Um caça F-35 durante a abertura do Dubai Air Show, nos Emirados Árabes Unidos, 13 de novembro de 2023.
Um caça F-35 durante a abertura do Dubai Air Show, nos Emirados Árabes Unidos, 13 de novembro de 2023. Direitos de autor  AP Photo, Kamran Jebreili
Direitos de autor AP Photo, Kamran Jebreili
De Anna Desmarais
Publicado a
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Portugal e o Canadá estão a ponderar a compra do caça sueco JAS 39 Gripen E/F como substituto do F-35 norte-americano. Será esta uma alternativa viável?

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Portugal e o Canadá estão a considerar alternativas ao já controverso caça F-35, fabricado nos Estados Unidos, de acordo com notícias recentes.

Micael Johansson, diretor executivo da empresa sueca Saab, confirmou aos meios de comunicação suecos que Portugal e o Canadá estão a estudar a possibilidade de comprar o caça JAS 39 Gripen E/F.

A notícia surge semanas depois de Nuno Melo, ministro da Defesa de Portugal, ter afirmado que estava cético quanto à compra do F-35A Lightening II dos Estados Unidos, produzido pela empresa aeroespacial e de defesa americana Lockheed Martin.

É um sentimento partilhado pelos homólogos do Governo do Canadá, que dizem à Euronews Next que lançaram uma revisão da aquisição do caça, mas não cancelaram o contrato.

Parte da preocupação em torno do F-35 é o receio de que esteja incorporado a bordo um "kill switch" que pode imobilizar os aviões, apesar de não existirem provas concretas desse facto e de a Lockheed Martin o ter refutado.

Mas será o avião de fabrico sueco um substituto viável para o F-35? Se não, haverá outra alternativa europeia que o possa ser?

Concebidos para coisas diferentes

Em primeiro lugar, os especialistas afirmam que o Gripen E/F e o F-35A Lightening II não são substituíveis porque foram "concebidos para coisas diferentes".

Walter Kowalski, antigo gestor de projetos da NATO, diz que a principal vantagem dos caças Gripen da Saab é o facto de poderem receber uma variedade de armas diferentes, incluindo mísseis de longo e curto alcance e bombas guiadas.

Esta compatibilidade permite que os países que compram o Gripen o personalizem com as peças e armas que já possuem, diz Kowalski.

O F-35 é como um Ferarri e o Gripen é como um Honda Civic. Não se consegue arranjar um Ferrari na berma da estrada, mas provavelmente consegue-se arranjar um Honda Civic.
Walt Kowalski
Antigo gestor de projetos da NATO

"O F-35 é como um Ferarri e o Gripen é como um Honda Civic", explica Kowalski, acrescentando que substituir as 150.000 peças do Gripen é mais fácil do substituir as peças do F-35.

"Não se consegue arranjar um Ferrari na berma da estrada, mas provavelmente consegue-se arranjar um Honda Civic".

Por exemplo, a Saab diz no site que o contrato do Gripen para o Brasil também veio com uma transferência de conhecimento para empresas brasileiras que vão ajudar o país a "desenvolver, produzir e manter" estes caças durante 40 anos, sem a necessidade de as equipas suecas fazerem atualizações.

Andrew Erskine, investigador do Institute for Peace & Diplomacy (IPD), diz que o F-35A Lightening II é modelado de acordo com o que os norte-americanos acreditam ser "o caça perfeito".

Um JAS Gripen 39 durante um exercício militar na Suécia, 4 de março de 2024.
Um JAS Gripen 39 durante um exercício militar na Suécia, 4 de março de 2024. Anders Wiklund/TT News Agency via AP

O Gripen supera o F-35A Lightening II na velocidade máxima, chegando aos 2.400 km/h em comparação com os 1.900 km/h do F-35. O Gripen também pode voar mais longe em missões e tem maior capacidade de armazenar combustível.

O Gripen também é menos dispendioso do que o F-35, acrescenta Kowalski, com um custo operacional estimado entre 4.700 dólares (4.135 euros) e 7.000 dólares (6.159 euros) por hora, em comparação com os 33.000 dólares (26.391 euros) e 40.000 dólares (35.188 euros) por hora do F35.

O tempo de execução da missão também é bastante diferente entre as aeronaves, explicou Erskine, com o Gripen pronto para uma nova missão em 20 minutos, em comparação com as três horas necessárias do F-35.

Mas quando o Gripen está pronto para partir, tem uma carga útil mais pequena, o que significa que pode transportar menos armas pesadas do que o F-35.

O F-35 também é um "sistema de sistemas", o que o torna furtivo e virtualmente indetetável para os sistemas de radar, acrescenta Erskine.

"O F-35 tem um software complexo que necessita de muitos sensores, muita interferência de radar e muitas capacidades de guerra eletrónica", diz

Portanto, se um país está à procura de um avião furtivo, o Gripen "não é a melhor referência" para este tipo de missão, acrescenta Kowalski.

Quão americano é cada caça?

Outra consideração importante para os países é o quão "americano" é o caça, concordam Erskine e Kowalski.

O Regulamento Americano sobre o Tráfico Internacional de Armas (ITAR) permite que os EUA tenham o controlo final sobre as tecnologias fabricadas no país que podem ser exportadas, em nome da proteção da segurança nacional. É o caso da maioria dos componentes do F-35.

Erskine diz que isso também significa que os países europeus que procuram peças para o F-35 têm de negociar diretamente com a administração norte-americana que estiver no poder, sem "qualquer outra via" para obter as peças.

Por isso, comprar o F-35A Lightening II significa que um país está a investir "num avião de alto custo com uma logística muito complexa e que está extremamente dependente de ser amigo da administração dos Estados Unidos nessa altura", acrescenta Kowalski.

Países como o Egito, o Qatar, a Índia, os Emirados Árabes Unidos, etc., estão habituados a componentes e sistemas norte-americanos.
Andrew Erskine
Investigador no Institute for Peace & Diplomacy (IPD)

Segundo Erskine, estima-se que cerca de 30% das peças do Gripen sejam fabricadas nos Estados Unidos, onde as patentes da tecnologia estão sob controlo norte-americano.

Um dos exemplos mais marcantes desta situação é o facto de o Gripen utilizar um motor F404 ou F414, fabricado pela Volvo, mas com um design da norte-americana General Electric, que os suecos atualizaram em 2023.

O sistema de suporte de vida da aeronave, que ajuda os pilotos a sobreviver em caso de emergência, como um fornecimento de oxigénio de reserva, é fabricado pela Honeywell, uma empresa aeroespacial sediada na Carolina do Norte.

Se a principal preocupação é evitar qualquer influência da administração norte-americana, Kowalski diz que o francês Dassault Rafale F4 é o caça no mercado que tem menos envolvimento do Governo dos EUA.

Dois pilotos da Força Aérea Francesa em frente a um caça Rafale durante um exercício militar, fevereiro de 2021
Dois pilotos da Força Aérea Francesa em frente a um caça Rafale durante um exercício militar, fevereiro de 2021 AP Photo/Michael Varaklas

O Rafale F4 é considerado "extremamente equilibrado" porque tem uma transição fácil das operações terrestres para as operações em porta-aviões, é de fácil manutenção e tem uma boa furtividade, o que significa que é útil para muitos tipos de missões, acrescenta.

Mas, segundo Kowalski, a Dassault - e, por extensão, o Governo francês - enfrentam muitos obstáculos se quiserem comercializar este avião como não tendo qualquer influência dos norte-americanos.

"Quando se vende a países como o Egito, o Qatar, a Índia, os Emirados Árabes Unidos, etc., eles estão habituados a componentes e sistemas norte-americanos", diz. "É isso que eles querem... E o cliente tem sempre razão".

Olhar para daqui a 25 anos

Kowalski adverte os países europeus que estão a repensar a inclusão do F-35 nas suas frotas a pensarem nos "próximos 25 anos" da sua segurança nacional.

"Levantar as mãos, ignorar a atual administração e parar o investimento na segurança nacional, não me parece sensato", afirma.

Em vez disso, aconselha os países da UE a "chegarem a um acordo" em Washington para encontrarem uma "solução proporcional e equitativa" que seja boa do ponto de vista económico e estratégico.

Para Erskine, a questão é: "O trumpismo estará terminado quando Trump se for embora?"

"Se olharmos para o vice-presidente, JD Vance, parece que ele está disposto a incorporar certos elementos trumpianos, quer se trate da diplomacia protecionista ou transacional do presidente Trump".

Erskine defende que a Europa deve formar uma coligação que partilhe tecnologia, peças críticas de caças e cadeias de abastecimento para acabar com a dependência das tecnologias norte-americanas.

"Precisamos de ter uma visão mais estratégica", afirma.

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