Terra está a entrar em "zona de perigo", alertam cientistas

Um homem patrulha para proteger o gado de roubos, junto à carcaça de um burro, no Quénia.
Um homem patrulha para proteger o gado de roubos, junto à carcaça de um burro, no Quénia. Direitos de autor AP Photo/Brian Inganga
Direitos de autor AP Photo/Brian Inganga
De  Euronews com APTN
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Planeta transpôs sete dos oito limites de segurança para a vida

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A Terra ultrapassou sete dos oito limites de segurança cientificamente estabelecidos para a vida. Estamos agora a entrar na "zona de perigo".

As conclusões são de um estudo publicado pelo grupo internacional de cientistas da Comissão da Terra, na revista Nature, que analisou as barreiras de proteção do ecossistema planetário. 

Pela primeira vez, o estudo contém medidas de "justiça", que incluem a prevenção de danos a países, etnias e géneros.

Que limites de segurança planetária foram ultrapassados?

Os oito limites que o estudo analisou foram o clima, a poluição atmosférica, a contaminação da água com fósforo e azoto devido à utilização excessiva de fertilizantes, o abastecimento de água subterrânea, a água doce de superfície, o ambiente natural não construído e o ambiente natural e construído pelo Homem em geral.

A poluição atmosférica foi o único limite planetário que não atingiu o ponto de perigo, sendo, contudo, perigoso a nível local e regional.

O clima ultrapassou os níveis nocivos para os seres humanos em grupo, mas não ultrapassou as diretrizes de segurança para o planeta como um sistema, segundo a análise do grupo sediado na Suécia.

Os investigadores encontraram zonas problemáticas em toda a Europa Oriental, no sul da Ásia, no Médio Oriente, no sudeste asiático, em partes de África, em grande parte do Brasil, do México, da China, e em parte do oeste dos EUA - em grande parte devido às alterações climáticas.

Cerca de dois terços da Terra não satisfazem os critérios de segurança da água doce, exemplificaram os cientistas.

Manish Swarup/Copyright 2021 The AP. All rights reserved
Uma mulher dá banho à filha no rio Yamuna, na Índia, coberto por uma espuma química causada pela poluição industrial e doméstica.Manish Swarup/Copyright 2021 The AP. All rights reserved

A situação do planeta não é terminal

"Estamos numa zona de perigo para a maioria dos limites do sistema terrestre", disse Kristie Ebi, coautora do estudo e professora de Clima e Saúde Pública na Universidade de Washington.

Se o planeta fizesse um check-up anual, "o nosso médico diria que a Terra está realmente muito doente neste momento", afirmou Joyeeta Gupta, copresidente da Comissão da Terra e professora de Ambiente na Universidade de Amesterdão.

O nosso médico diria que a Terra está realmente muito doente neste momento.
Joyeeta Gupta
Copresidente da Comissão da Terra

"Está doente em muitas áreas ou sistemas diferentes e esta doença também está a afetar as pessoas que vivem na Terra".

Não se trata de um diagnóstico terminal. O planeta pode recuperar se houver mudanças, nomeadamente na utilização de carvão, petróleo e gás natural e na forma como trata o solo e a água, realçam os cientistas.

No entanto, "estamos a avançar na direção errada em basicamente todos estes aspetos", alerta o autor principal do estudo, Johan Rockstrom, diretor do Instituto Potsdam para a Investigação do Impacto Climático, na Alemanha.

"Este é um documento convincente e provocador - cientificamente sólido em termos de metodologia e importante para identificar as dimensões em que o planeta se está a aproximar dos limites que nos lançariam para estados irreversíveis", aponta Indy Burke, reitor da Escola do Ambiente de Yale.

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Árvores carbonizadas por um incêndio florestal que varreu a região de Vila Nova Samuel, no Brasil.Eraldo Peres/Copyright 2018 The AP. All rights reserved

Como é que os cientistas criaram estes limites de segurança?

A equipa de cerca de 40 cientistas criou limites quantificáveis para cada categoria ambiental, tanto para o que é seguro para o planeta, como para o ponto em que se torna prejudicial para grupos de pessoas, o que os investigadores denominaram "uma questão de justiça".

Johan Rockstrom esclarece que pensa nesses pontos como a criação de "uma barreira de segurança" fora da qual os riscos se tornam mais elevados, mas não necessariamente fatais.

No passado, o autor e outros cientistas tentaram este tipo de medição holística dos vários ecossistemas interligados da Terra. 

A grande diferença do atual estudo é que os especialistas também olharam para os níveis local e regional. Além disso, acrescentaram o elemento da justiça, que inclui a equidade entre gerações novas e velhas, entre nações diferentes e até entre espécies distintas. 

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Frequentemente, este elemento aplica-se a condições que prejudicam mais as pessoas do que o planeta. Um exemplo disso são as alterações climáticas.

Há danos mesmo com apenas 1 grau centígrado de aquecimento

A investigação utiliza o mesmo limite de 1,5 graus Celsius de aquecimento desde a era pré-industrial, que os líderes internacionais acordaram no acordo climático de Paris de 2015. 

O mundo até agora aqueceu cerca de 1,1 graus Celsius. Não atravessou a cerca de segurança, Rockstrom e Gupta disseram, mas isso não significa que as pessoas não estão a sofrer com isso.

"O que estamos a tentar mostrar através do nosso artigo é que mesmo a 1 grau centígrado, há uma enorme quantidade de danos a ocorrer", disse Gupta, apontando para dezenas de milhões de pessoas que estão expostas a temperaturas extremamente quentes.

A barreira de segurança planetária de 1,5 graus não foi ultrapassada, mas o limite "justo" de 1 grau, onde as pessoas sofrem, foi ultrapassado.

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"A sustentabilidade e a justiça são inseparáveis", afirmou Chris Field, diretor de Estudos Ambientais de Stanford. 

Field disse que gostaria de ter limites ainda mais rigorosos. "As condições de insegurança não precisam de cobrir uma grande fração da área da Terra para serem inaceitáveis, especialmente se as condições de insegurança estiverem concentradas nas comunidades pobres e vulneráveis".

Outra especialista, Lynn Goldman, professora de Saúde Ambiental e reitora da Escola de Saúde Pública da Universidade George Washington, referiu que o estudo era "um pouco ousado", mas não estava otimista quanto à possibilidade de resultar em grandes ações.

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