Estima-se que incêndios florestais tenham devastado mais de 46 000 hectares este ano no Reino Unido, a maior área desde o início da monitorização.
Reino Unido avisado de que está “perigosamente despreparado” face à ameaça crescente de incêndios florestais, cheias e impactos mais amplos da crise climática, com especialistas a pedirem investimento “imediato”.
Entre janeiro e novembro, o Global Wildfire Information System estima que os incêndios florestais queimaram 47.026 hectares no Reino Unido.
É a maior área desde o início da monitorização em 2012 e o dobro da superfície ardida no verão recorde de 2022, quando o Met Office concluiu que as alterações climáticas tornaram os incêndios graves seis vezes mais prováveis.
‘Limitar os danos’ das alterações climáticas
O número recorde de focos levou a apelos ao governo britânicopara “limitar os danos das alterações climáticas” reduzindo urgentemente as emissões de carbono.
O sindicato Fire Brigades Union, que representa bombeiros e pessoal de controlo no Reino Unido, alerta que o número de dias com perigo de incêndio “muito elevado” irá triplicar na década de 2050 e aumentar mais de cinco vezes na de 2080 se o aquecimento global continuar a acelerar.
Aumenta acentuadamente o risco de precipitação intensa, criando uma séria ameaça de cheias em todo o país “agora e no futuro”. No fim de semana, a tempestade Claudia provocou cheias graves em zonas do País de Gales e de Inglaterra, com pelo menos um incidente grave declarado.
O sindicato enviou uma carta à ministra das Finanças, Rachel Reeves, e ao ministro da Energia e das Alterações Climáticas, Ed Miliband, apelando a que o Reino Unido implemente uma estratégia nacional para preparar os serviços de incêndio e salvamento para a “crise climática acelerada”.
Reino Unido: cortes no orçamento
“Os serviços de incêndio e salvamento perderam quase 12.000 bombeiros desde 2010, o que equivale a um em cada cinco postos”, lê-se na carta – também assinada pela Greenpeace, pela Tax Justice UK e pela Friends of the Earth.
“O financiamento do governo central foi reduzido em 30 por cento só em termos nominais, e muito mais em termos reais.”
O sindicato argumenta que isto deixou muitos serviços com escassez de equipamento, salas de controlo subdimensionadas e equipamento de proteção “insuficiente”.
Em agosto, foram mobilizados 17 serviços de incêndio e salvamento, alguns tão longe como Greater Manchester, para responder a um incêndio florestalem Holt Heath, Dorset (a cerca de 363 km).
Muitos dos bombeiros destacados para o incidente não tinham EPI específicos para incêndios florestais, aumentando o risco de golpe de calor, exaustão e queimaduras.
Apesar das dificuldades evidentes causadas pelos cortes no investimento, o sindicato afirma que o acordo de financiamento das autarquias deste ano prevê novas reduções.
“A modelização do National Fire Chiefs Council (NFCC) mostrou que poderão ser cortados mais 102 milhões de libras [cerca de 116 milhões de euros] para colmatar a falta de verbas, deixando os serviços de incêndio menos capazes de responder a incidentes de grande dimensão”, acrescenta a carta.
Incêndios florestais na Europa
Na Europa continental, o cenário é igualmente sombrio, com mais de um milhão de hectaresa arder na UE desde o início do ano.
É quatro vezes mais do que no ano passado e equivale a uma área superior à de toda a Córsega.
No total, foram registados mais de 1.800 incêndios florestais, que emitiram mais de 38 milhões de toneladas de CO₂. Dos 27 Estados-membros da UE, apenas a Chéquia, a Estónia, a Lituânia, o Luxemburgo e Malta não reportaram incêndios florestais em 2025.
Responsabilidade das alterações climáticas?
“Muitos dos incêndios que monitorizámos e observámos estão a ocorrer onde as anomalias climáticas mostram condições muito mais secas e mais quentes do que a média”, disse à Euronews Mark Parrington, cientista no Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de Médio Prazo.
O especialista alerta que, quando sopram ventos quentes e secos, a ignição pode ocorrer “muito rapidamente” em larga escala e tornar-se “muito intensa”.
Portugal e Espanha viveram incêndios florestais sem precedentes neste verão, responsáveis por mais de dois terços da devastação na UE, impulsionados por temperaturas acima dos 40 ºC e ventos fortes.
Segundo investigação da World Weather Attribution (WWA), estes incêndios mortais foram cerca de 40 vezes mais prováveis devido àsalterações climáticas.
“Com cada fração de grau de aquecimento, ondas de calor extremas e prolongadas continuarão a intensificar-se, aumentando a probabilidade de grandes incêndios como os que queimaram vastas áreas da Península Ibérica”, alerta a investigadora Dra. Clair Barnes, do Centre for Environmental Policy do Imperial College London.
UE gasta o suficiente para enfrentar incêndios florestais?
Entre 2022 e 2023, os governos da UE aumentaram a despesa com serviços de proteção contra incêndios em 8,5 por cento, para 40,6 mil milhões de euros.
Mas sindicatos por toda a Europa afirmam que está longe de ser suficiente face às ameaças crescentes ligadas às alterações climáticas.
“Com o aumento de incêndios e cheias devido às alterações climáticas, não podemos ter orçamentos estagnados”, disse o secretário-geral da EPSU, Jan Willem Goudriaa.
“É tempo de aumentar substancialmente o investimento público na manutenção florestal, gestão da água, serviços de incêndio e proteção civil, bem como na prevenção.”
Alemanha, França, Polónia, Itália e Espanha têm os maiores contingentes de bombeiros profissionais, cada um com entre 42.100 e 61.700 elementos.
Já em 2024, Portugal reduziu o recrutamento em seis por cento.
A Euronews Green contactou o Departamento para a Segurança Energética e Emissões Líquidas Nulas do Reino Unido para comentário.