Inspetor-chefe ataca integridade de autoridades no processo Qatargate

Antigo deputado ao Parlamento Europeu Pier Antonio Panzeri
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De  Mared Gwyn JonesMaria Psara; Isabel Marques da Silva (Trad.)
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Artigo publicado originalmente em inglês

Uma conversa gravada secretamente, a que a Euronews teve acesso, mostra um dos principais investigadores da polícia no chamado processo Qatargate - corrupção no Parlamento Europeu - a questionar a integridade do arrependido, dos juízes e do sistema político.

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(Artigo atualizado às 19h08 para incluir reação do Ministério Público Federal belga)

O arguido Francesco Giorgi gravou secretamente uma conversa com o polícia belga Ceferino Alvarez Rodriguez, quando este o visitou no seu apartamento, em maio do ano passado.

Na gravação, que a Euronews obteve, o inspetor-chefe acusa o antigo eurodeputado socialista italiano Pier Antonio Panzeri de mentir, sendo este o presumível cabecilha do grupo acusado e que fez um acordo com as autoridades belgas para revelar tudo sobre o caso de corrupção.

"Não acreditamos em nada do que ele diz", lê-se numa transcrição da conversa. "Sabemos muito bem que ele nos está a enganar, nós sabemos. Mas tudo isto vai rebentar", acrescentou Ceferino Alvarez Rodriguez.

O arguido Francesco Giorgi (italiano) era assistente parlamentar de Panzeri e é companheiro de vida da eurodeputada socialista grega Eva Kaili (vice-presidente do Parlamento Europeu entretanto destituída), sendo estes dois dos principais acusados no processo de alegada troca de favores por dinheiro junto das autoridades do Qatar e de Marrocos.

Ambos os países contestaram veementemente as acusações. Enquanto Panzeri e Giorgi admitiram ter cometido atos ilícitos, Kaili continua a defender a sua inocência.

Os juízes e os políticos que os "nomeiam"

A conversa em francês, gravada no telemóvel de Giorgi, mostra também o inspetor Alvarez Rodriguez a queixar-se dos juízes nomeados "politicamente": "Não tenho confiança no sistema judicial porque a justiça é manipulada por cordelinhos, por políticos", terá dito.

"Não podemos confiar no poder judicial", acrescentou Alvarez Rodriguez que trabalhou com o ex-juiz do caso, Michel Claise que, entretanto, se demitiu, na sequência de alegações de que não era imparcial.

Claise deixou o caso quando foi revelado que o seu filho era sócio, numa empresa de canábis medicinal, do filho de Maria Arena, outra eurodeputada socialista (belga) que foi envolvida no escândalo durante a fase de investigação, mas que não foi constituída arguida.

De acordo com o Ministério Público, Claise demitiu-se "por uma questão de prudência" e para "manter a necessária separação entre a vida privada e familiar e as responsabilidades profissionais".

A conversa gravada, que a equipa jurídica de Giorgi pediu para ser considerada como uma nova prova no caso, acrescenta mais turbulência aos esforços para processar os suspeitos. Os numerosos fracassos da investigação belga levaram muitos a apelidar o caso de "Belgium-gate".

O acesso a meios de prova

A conversa entre Giorgi e Alvarez Rodriguez terá ocorrido a 3 de maio do ano passado, quando o investigador foi devolver o telemóvel de Giorgi, que tinha sido apreendido durante a sua audição, dias antes, a 27 de abril.

Durante a visita, Giorgi queixou-se do facto de o seu computador portátil, que incluía notas confidenciais que redigiu com o seu advogado, ter sido confiscado por agentes da polícia durante uma busca ordenada pelo juiz Claise, enquanto Giorgi assistia à sua audiência de 27 de abril, alegando que tal violava o seu direito de defesa.

Em resposta às queixas de Giorgi, o investigador Alvarez Rodriguez terá repetido duas vezes: "É esse o jogo".

De acordo com a transcrição, o investigador afirma ainda que é "normal" que a sua equipa tenha acesso às notas confidenciais de Giorgi, uma vez que o seu conteúdo prova que Giorgi também teve acesso aos seus próprios ficheiros de investigação.

O investigador terá dito a Giorgi: "Adaptas o teu discurso ao que está no dossiê. É por isso que não pomos tudo. Não somos idiotas, por isso sabemos que nos está a mentir".

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A transcrição da conversa é um dos três ficheiros que os advogados de Giorgi apresentaram para serem considerados como novas provas na investigação, de acordo com um documento visto pela Euronews. A gravação original, em formato vídeo, bem como um vídeo legendado preparado por Giorgi também foram disponibilizados.

Reação do Ministério Público Federal belga

Em reação a esta notícia, o  Ministério Público Federal belga emitiu um comunicado, ao final da tarde, no qual realça que "pretende manter o debate judicial no seu lugar e reserva seu posicionamento à autoridade judiciária competente".

Mesmo assim, faz dois esclarecimentos:

-"Que o trabalho de investigação consiste, nomeadamente, em verificar a veracidade das declarações prestadas pelo arrependido e o cumprimento das condições exigidas por lei para a obtenção desse estatuto".

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- "Está actualmente pendente um procedimento perante um órgão independente (a Câmara de Acusação) para examinar a legalidade de um determinado número de ações de investigação levadas a cabo. As conclusões resultantes da sua decisão serão obviamente tidas em conta na investigação".

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