Quarto dia da invasão russa na Ucrânia, ordenada por Vladimir Putin. O cerco a Kiev intensificou-se na madrugada deste domingo e os combates entraram no centro de Kharkiv, a segunda maior cidade do país, situada no nordeste do país e ainda sob controlo ucraniano.
União Europeia anuncia o fecho do espaço aéreo dos 27 Estados-membros às companhias de aviação russas, a todos os aviões detidos por russos ou registados na Rússia, e ainda o financiamento da compra de armas para ajudar a Ucrânia a resistir contra a invasão ordenada quinta-feoira por Vladimir Putin. O bloco europeu vai ainda banir alguns meios de comunicação russos.
"Pela primeira vez na história, a União Europeia vai financiar a compra e a entrega de armas e outro equipamento a um país que está a ser atacado", anunciou a Presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen, garantindo que os aviões com ligação à Rússia vo deixar de descolar, aterrar e voar em território do bloco europeu.
A Turquia admite bloquear o acesso dos navios de guerra da Rússia ao estreitos do Bósforo e de Dardanelos, as duas ligações marítimas do Mar Negro ao Mediterrâneo**.**
"Concluímos que a situação na Ucrânia se tornou numa guerra e vamos implementar as disposições da convenção de Montreaux de forma ransparente", afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros Mevlüt Çavuşoğlu, citado pelo Guardian.
A decisão marca uma alteração da posição neutral que a Turquia vinha manifestando em relação à invasão russa da Ucrânia e vai ao encontro dos termos da convenção que admite ao gestor reconhecido dos estreitos o bloqueio dos mesmos em caso de guerra.
Vladimir Putin terá concordado em encetar negociações com o Governo da Ucrânia sem impor quaisquer condições prévias, como antes havia exigido, nomeadamente o reconhecimento da anexação da Crimeia e a rejeição da NATO.
"É já uma vitória", reagiu o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmytro Kuleba, garantindo que a Ucrânia "não vai abdicar de um centímetro do seu território" a favor do Kremlin.
Kuleba mostra-se otimista, disse estar em curso "uma guerra entre o presidente Putin e o povo ucraniano" e garantiu haver "determinação na vitória sobre a Rússia". "Tal como derrotámos o monstro anterior na Europa há 80 anos", afirmou em mais uma comparação entre Putin e Hitler.
O acordo para as negociações surgiu após Vladimir Putinter ordenado o Ministério da Defesa e o Chefe do Estado-Maior para colocarem "as forças de dissuasão em modo de alerta para combate" após o agravamento da pressão internacional sobre a invasão russa em curso na Ucrânia.
Os meios de comunicação ocidentais estão a interpretar as palavras do presidente russo considerando as referidas "forças de dissuasão" como incluindo as armas nucleares da federação.
A Ucrânia entende este alerta como uma manobra de pressão antes das negociações e os Estados Unidos acusam o líder russo de estar "a fabricar ameaças que não existem".
"Este é um padrão repetido que temos visto do presidente Putin durante este conflito, que consiste em fabricar ameaças que não existem para justificar uma agressão contínua", afirmou Jenn Psaki, a porta-voz da Casa Branca.
O secretário-geral da NATO entende o alerta russo como "uma retórica perigosa e um comportamento irresponsável" de Putin, que "acentua ainda mais a gravidade do situação no terreno".
A Bielorrússia mostra-se disponível para receber armas nucleares se os países vizinhos, Polónia e Lituânia, ambos membros da NATO, também as tiverem e avisa que a "Rússia está a ser empurrada para uma terceira guerra mundial".
O líder bielorrusso, Aleksander Lukashenko falou esta manhã com o homólogo Zelenskyy, com quem terá acordado receber o encontro entre delegações ucranianas e russas na fronteira, sob condição de não usar qualquer força militar contra território ucraniano até ao final do encontro.
Rússia revela nervosismo
Mostrando algum nervosismo após o agravar das sanções ocidentais, a Rússia exigiu à Alphabet, detentora da multiplataforma Google, o restabelecimento do acesso aos canais oficiais de Youtube no território ucraniano.
A agência federal Roskomnadzor exige a retirada dasrestrições impostas aos canais russófonos RBC, TV Zvezda e Sputnik, avançou a Reuters.
A exigência russa surge depois de na sexta-feira o Kremlin ter ordenado a limitação do acesso às plataformas da Meta, a empresa mãe da Facebook, por alegada "censura" aos meios de comunicação russos.
A Agência Federal dos Transportes Aéreos, a Rosaviatsia, está a pedir às transportadoras russas para respeitarem os direitos dos passageiros nos voos internos e também para os voos previstos para o enclave de Kalinegrado, entre a Polónia e a Lituânia.
O Presidente da Ucrânia submeteu uma queixa contra a Rússia ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, e pede uma decisão urgente.
"A Rússia tem de ser responsabilizada por manipular a noção de genocídio para justificar a agressão. Pedimos uma decisão urgente, ordenando a Rússia a parar a atividade militar já e aguardar julgamentos a partir da próxima semana", escreveu Volodymyr Zelenskyy nas redes sociais.
A Ucrânia está a tentar organizar uma espécie de "legião estrangeira" de cidadãos não ucranianos amigos do país para combater contra a invasão russa.
"Todos os estrangeiros que desejem juntar-se à resistência contra os ocupantes russos e proteger a segurança mundial são convidados pelas autoridades ucranianos a juntar-se às forças de defesa", anunciou o Presidente Zelenskyy, numa das várias mensagens difundidas este domingo.
Ajuda internacional à Ucrânia
Portugal e Roménia, dois membros da União Europeia e da NATO, anunciaram o envio para a Ucrânia de equipamentos militares, incluindo "óculos de visão noturna e munições de diferentes calibres", por parte dos portugueses, combustível e coletes à prova de bala", pelos romenos.
Portugal antecipou o fecho pela União Europeia do espaço aéreo a companhias russas. O Canadá também se juntou ao embargo europeu à aviação civil russa.
O governo italiano anunciou ainda "o pagamento imediato de 110 milhões de euros ao Governo ucraniano", num "sinal concreto de solidariedade e apoio a um povo" com quem os italianos têm "uma relação fraterna", escreveu o ministro dos Negócios Estrangeiros Luigi di Maio nas redes sociais.
O Papa Francisco aproveitou a missa deste domingo para manifestar apoio ao povo ucraniano. "Deus está com quem promove a Paz, não com quem recorre à violência", defendeu o líder da igreja católica, no Vaticano, dando força ao apelo urgente de ajuda humanitária aos deslocados pela invasão russa e condenando aqueles que "confiam na diabólica e perversa lógica das armas".
Na Alemanha, o chanceler mostrou solidariedade com o povo da Ucrânia e considerou a ofensiva russa como "criminosa".
Scholz diz que nunca houve tanta união como agora e que a ideia de Putin recuperar o império russo tem de reger as ações futuras dos aliados, justificando desta forma a constituição de um fundo extraordinário para financiar as forças armadas alemãs.
A partir do próximo orçamento federal, o governo alemão vai passar a contribuir com 2% do PIB para a Defesa.
Neste esforço de modernização militar, o chanceler disse que queria "construir novas armas com parceiros como a França", um dos principais promotores da criação de um exército europeu para defesa dos "27".
Olaf Scholz falou do envio de armamento para ajudar a resistência da Ucrânia, sublinha "o isolamento de Putin" no palco internacional e defendeu que as "sanções resultam".
Explicou a mudança de posição em relação à exclusão de bancos russos do sistema SWIFT, que agora a Alemanha apoia e que foi anunciada pela Presidente da Comissão Europeia na noite de sábado.
O chanceler separa o líder do Kremlin dos russos e lembra amizade histórica entre ambos os povos, russo e alemão, sendo muito aplaudido pelos deputados alemães, num Parlamento com muita gente a envergar vestuário nas cores da bandeira da Ucrânia.
O Japão também se juntou à exclusão europeia e americana de sete bancos da Rússia no sistema bancrio SWIFT, que permite pagamentos internacionais e estando bloqueado afeta as exportações e importações do país afetado.
Resistência firme em Kiev
O Presidente Volodymyr Zelenskyy telefonou este domingo a Marcelo Rebelo de Sousa e atualizou o homólogo português da situação na Ucrânia.
"O Presidente da República reiterou a condenação veemente de Portugal e o apoio solidário à corajosa resistência ucraniana. Apoio esse cuja concretização tem sido efetivada pelo Governo, nomeadamente através dos Ministérios competentes. Sublinhou igualmente o papel da excecional comunidade ucraniana em Portugal", lê-se na nota publicada pela presidência portuguesa, onde ainda é enaltecida "a parceria no âmbito da política europeia de vizinhança da qual a Ucrânia é parte".
Zelesnkyy mantém-se na capital ucraniana, a difundir mensagens regulares pelas redes sociais para tentar mitigar o impacto da desinformação, uma das armas que tem sido utilizada pelo Kremlin para tentar acelerar o derrube do atual governo ucraniano.
A Rússia noticiou esta manhã a eventual abertura do líder ucraniano para negociar, mas Zelenskyy desmentiu a informação avançada pelo porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, que apontava Minsk como o local acordado para as negociações.
O presidente ucraniano admite negociar, mas num primeiro momento apenas noutro país não envolvido na "agressão" à Ucrânia.
Entretanto, como revelou pelo Facebook, Zelenskyy admitiu em conversa com o homólogo bielorrusso Lukashenko um encontro entre delegações ucranianas e russas na zona fronteiriça do rio Pripyat, mas "sem condições prévias", como exige o Kremlin.
"Lukashenko assumiu a responsabilidade de durante o encontro os aviões, helicópteros e mísseis colocados na Bielorrússia se mantenham no solo", acrescentou o Presidente da Ucrânia.
Zelensky apelou inclusive aos cidadãos estrangeiros na Ucrânia a pegar nas armas e a juntarem-se à resistência contra a invasão russa. Pelo menos um português, Alexandre Pinto, atualmente em Poltava, já confessou à Rússia que ir pegar em armas e juntar-se ao que chamou de "tropas civis" ucranianas.
O Presidente ucraniano acusa a Rússia de estar a bombardear áreas residenciais, nomeadamente em Kiev, e prometeu manter a luta "tanto quanto possível para libertar o país".
"A noite passada foi brutal na Ucrânia. De novo, houve tiroteios, bombardeamentos de áreas residenciais e infraestruturas civis. Hoje, não existe nada no país que os agressores não considerem como um alvo. Combatem contra todos. Combatem contra tudo que mexe, contra infantários, contra edifícios residenciais e até contra ambulâncias", denunciou Zelenskyy.
Em Moscovo, há russos a prestar tributo este domingo de manhã a Boris Nemtsov, um conhecido opositor de Vladimir Putin que foi assassinado a 27 de fevereiro de 2015 numa ponte perto do Kremlin.
"Boris estaria em choque com esta guerra. Sentimos muita a falta dele", afirmou Tatyana Golika, citada pelo jornal Guardian,uma das pessoas que depositou flores no local onde foi assassinado Nemtsov.
O balanço de vítimas e deslocados
A Agência da ONU para os Refugiados estima haver já mais de 368 mil deslocados devido à invasão russa na Ucrânia e esse número continua a aumentar, sublinha o organismo, citando as autoridades nacionais implicadas no êxodo.
O porta-voz da agência, Chris Melzer, está a enviar relatos da fronteira polaca e, na noite de sábado, adiantava haver uma espera de 40 horas na fuga à guerra, numa noite com temperaturas de menos dois graus centígrados, estimando terem entrado na Polónia entre as 07h da manhã locais e as 22 horas mais de 45 mil deslocados oriundos da Ucrânia.
A ministra adjunta da Defesa da Ucrânia, Hanna Malyar, afirmou este domingo que a Rússia já ter perdido cerca de 4.300 soldados nesta invasão da Ucrânia, mais de 140 tanques, 27 aviões e 26 helicópteros. Um balanço que requer ainda confirmação imparcial.