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Presente de Natal envenenado: desconto no imposto dos combustíveis vai acabar

Um camião-cisterna entrega combustível num posto de gasolina em Braga, norte de Portugal, na quarta-feira, 17 de abril de 2019.
Um camião-cisterna entrega combustível num posto de gasolina em Braga, norte de Portugal, na quarta-feira, 17 de abril de 2019. Direitos de autor  Luis Vieira/Copyright 2019 The AP. All rights reserved
Direitos de autor Luis Vieira/Copyright 2019 The AP. All rights reserved
De Ana Filipa Palma
Publicado a Últimas notícias
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O Governo terminou com o desconto extraordinário no imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP), criado em 2022 pelo executivo de António Costa, devido à pressão de Bruxelas. Portugal é um dos países que, mesmo sem o desconto, paga mais taxas sobre os combustíveis.

Dezembro começou com um presente vindo dos mercados: a descida do preço dos combustíveis. No entanto, o embrulho prometia mais do que o conteúdo. A redução acabou por ficar aquém das expectativas dos portugueses, já que o Governo, conforme havia anunciado, aproveitou esta altura para alterar o desconto aplicado ao Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISP).

Este desconto no ISP foi introduzido pelo governo de António Costa em 2022 como medida temporária face ao aumento dos preços dos combustíveis devido à pandemia de COVID-19 e à invasão da Ucrânia pela Rússia.

Contudo, Bruxelas tem vindo a pressionar Portugal, tal como outros Estados-membros, para retirar o apoio ao imposto, uma vez que a ferramenta utilizada foi criada ao abrigo de condições específicas de ajudas de Estado e essas mesmas razões não se mantêm.

“Consideramos que é necessário que os Estados-membros eliminem gradualmente essas medidas fiscais para melhorar a sustentabilidade orçamental”, referiu, há duas semanas, na apresentação das Previsões Económicas de Outono de 2025, o Comissário Europeu para a Economia e Produtividade, Valdis Dombrovskis.

Valdis Dombrovskis durante uma conferência de imprensa após uma reunião dos ministros das Finanças da UE no edifício do Conselho Europeu, em Bruxelas, 21 de janeiro 2025
Valdis Dombrovskis durante uma conferência de imprensa após uma reunião dos ministros das Finanças da UE no edifício do Conselho Europeu, em Bruxelas, 21 de janeiro 2025 Omar Havana/Copyright 2025 The AP. All rights reserved.

Assim, na semana passada foi criada uma portaria, com entrada em vigor esta segunda-feira, 1 de dezembro, onde se refere o início desse ajuste gradual.

"A portaria procede à reversão parcial das medidas extraordinárias e temporárias, atualizando as taxas unitárias do ISP sobre a gasolina e o gasóleo, promovendo a indispensável reversão gradual das medidas temporárias adotadas em sede de ISP", pode ler-se no Diário da República.

A taxa do ISP aplicável, no continente, à gasolina com chumbo é fixada no valor de 497,52 euros por 1000 litros e, no caso do gasóleo, é fixada no valor de 361,60 euros por 1000 litros. Antes desta revisão, a taxa era de 481,26 euros na gasolina e de 337,21 euros no gasóleo.

Com as épocas festivas à porta, o aumento dos preços era tudo o que os portugueses não queriam, uma vez que o impacto fundamental do corte dos descontos no ISP será sentido pelos consumidores, que verão o preço de bens e serviços, como os transportes públicos, aumentar.

“O aumento dos combustíveis leva sempre ao aumento do custo dos transportes de pessoas e mercadorias, o que tem depois reflexo direto no custo de outros bens que têm de ser transportados para as prateleiras dos supermercados, para as lojas e, consequentemente, para a casa das pessoas”, diz António Comprido, secretário-geral da EPCOL, à Euronews.

Para o secretário-geral da EPCOL (Empresas Portuguesas de Combustíveis e Lubrificantes), que reúne empresas como a BP, Moeve, Galp, PRIO ou Repsol, “o Governo, se quisesse, podia perfeitamente fixar um valor de ISP abaixo daquele que está atualmente, de acordo com as regras europeias”, defendeu.

O imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) é um tributo estabelecido por cada país, sob diretivas da União Europeia, e Portugal está acima da taxa mínima obrigatória pela UE.

Os preços nos mercados internacionais dos combustíveis estão muito abaixo dos que vigoravam na altura que motivou a redução do ISP, contudo António Comprido acredita que a situação geopolítica atual não garante estabilidade. “As tensões são muitas: desde as situações de guerra que ainda existem às portas da Europa; a guerra comercial iniciada pelos Estados Unidos com a imposição de tarifas e depois as reações de outros países; o embargo aos produtos petrolíferos da Rússia, que é um produtor importante e que acaba também por ter influência no mercado”, relembra.

“Não vivemos uma situação de grande estabilidade e grande previsibilidade e, embora os preços tenham vindo a manter-se a níveis razoáveis, nada nos garante que isso vai continuar”, conclui António Comprido.

“Turismo de combustível” em Espanha vai aumentar

Esta semana estava prevista uma descida de sete cêntimos por litro no gasóleo e de 3,5 cêntimos por litro na gasolina, mas com o corte dos apoios no ISP, e a consequente subida do mesmo, o gasóleo desceu cinco cêntimos e a gasolina apenas dois.

Segundo dados da análise do 3.º trimestre de 2025 da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), tanto na gasolina como no gasóleo os preços médios de venda (PMV) nacionais são mais altos do que a média da UE.

Portugal confronta-se com o problema de o país fronteiriço, Espanha, ter preços dos combustíveis mais baixos devido não só ao IVA, mas também ao ISP. Em Espanha o IVA é de 21% e em Portugal é de 23%.

“Nós temos um diferencial muito significativo em termos de ISP com Espanha, o que leva ao conhecido fenómeno de turismo de combustível, em que empresas de transporte e particulares abastecem-se em Espanha para poder beneficiar desses valores mais baixos”, alerta António Comprido.

Ou seja, se com o apoio ao ISP o contraste entre os dois países já era grande, sem este apoio será ainda mais demarcado.

Na análise da ERSE do 3.º trimestre deste ano é possível ver que, em Espanha, a gasolina esteve a 1,48 euros o litro enquanto em Portugal esteve a 1,69 euros o litro — 21,3 cêntimos a mais. O gasóleo também era mais barato em Espanha: custava 1,41 euros o litro, enquanto em Portugal custava 1,57 euros, mais 16 cêntimos.

Esta diferença será maior a partir desta semana, o que vai potenciar uma “economia transfronteiriça”.

Portugal é também um país com um poder de compra relativamente baixo em termos da média europeia; “portanto, isto em termos do esforço que é pedido aos consumidores é mais significativo”, destaca António Comprido.

“Subsídio aos combustíveis fósseis”

Se por um lado as diretivas europeias apontam para uma melhor sustentabilidade orçamental para o país, por outro, o impacto ambiental destas medidas que incentivam o consumo de combustíveis fósseis também entra na discussão.

Numa carta enviada ao Ministério das Finanças, em junho, a Comissão Europeia alegou que a medida “funciona como subsídio aos combustíveis fósseis” e “não está alinhada com as recomendações do Conselho Europeu.”

Para o secretário-geral da EPCOL, têm de existir alternativas imediatas, e falta essa estratégia, tanto a nível europeu como em Portugal. “Sem haver alternativa de imediato, não se pode ir a correr trocar os veículos, como se faz no programa E-Lar, em que se troca o fogão e o esquentador por uma placa elétrica ou por um cilindro. É uma coisa um bocadinho mais complicada”, ironiza.

Aumentar os impostos a produtos que, neste momento, são insubstituíveis só vai penalizar os consumidores, que vão ter de pagar mais por produtos que são indispensáveis para a sua vida e para o seu dia-a-dia”, volta a alertar.

Com o fim anunciado do desconto no ISP, os consumidores ficam agora à espera de perceber qual será o impacto real no seu quotidiano.

Entre a pressão europeia para cumprir as suas recomendações, a instabilidade geopolítica e a falta de alternativas imediatas aos combustíveis fósseis, o próximo ano promete trazer novos debates sobre o sistema fiscal do país e a transição energética.

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