Macron afirmou recentemente que a China oferece às suas crianças uma versão mais educativa do TikTok, enquanto a versão disponível na Europa foi concebida, na sua opinião, para entorpecer as mentes dos jovens. O Cubo comparou o conteúdo das duas versões da aplicação.
O presidente francês Emmanuel Macron sugeriu que a China está a oferecer às crianças europeias uma versão simples e baseada no entretenimento do TikTok, enquanto a sua versão nacional é muito mais educativa e benéfica para os jovens.
Falando aos leitores do jornal diário regional La Voix du Nord, no norte de França, a 19 de novembro, Macron apontou as disparidades entre a oferta chinesa e a oferta mundial da aplicação.
"A versão chinesa do TikTok, porque é uma empresa chinesa, está limitada a um determinado número de horas por dia e o conteúdo mostrado às crianças é inteiramente educacional", disse o presidente.
A China "compreendeu que estamos no meio de uma guerra cognitiva" e que a sua estratégia consiste em "exportar o que entorpece as mentes jovens, mantendo o que torna os jovens mais inteligentes para a sua própria população".
Sim, existe uma versão diferente do TikTok para o mercado chinês
A versão chinesa a que Macron se refere é conhecida como Douyin e é desenvolvida pela empresa de software chinesa ByteDance, que também é proprietária do TikTok.
Em termos gerais, o Douyin e o TikTok partilham o mesmo logótipo, estrutura e arquitetura digital, mas a principal diferença entre as duas plataformas reside no seu público.
O Douyin foi lançado em 2016 especificamente para o mercado chinês, enquanto o TikTok arrancou um ano depois para os utilizadores internacionais, oferecendo diferentes tipos de conteúdos aos respetivos públicos.
A China aplica uma censura rigorosa nas suas plataformas de redes sociais, proibindo e filtrando qualquer conteúdo considerado desfavorável ao governo ou suscetível de provocar instabilidade política.
Este facto é evidente nos próprios termos da política do Douyin: incluem regras que proíbem conteúdos "que distorcem e denigrem as belas tradições culturais da nação, bem como qualquer material que prejudique os sentimentos nacionais".
A esta regulamentação acresce a lei chinesa sobre a proteção de menores, introduzida em 2021, que obriga as plataformas sociais a implementar ferramentas que limitem a utilização por parte das crianças.
Como resultado, a ByteDance anunciou um limite de tempo de ecrã de 40 minutos por dia para os utilizadores com menos de 14 anos, que também estão impedidos de utilizar a aplicação entre as 22h e as 6h.
O Douyin apresenta conteúdos "mais inteligentes" do que o TikTok?
Para verificar se as afirmações de Macron sobre o conteúdo do Douyin para crianças eram verdadeiras, O Cubo, a equipa de verificação de factos da Euronews, usou uma VPN para descarregar a aplicação e criar um perfil de utilizador de 13 anos.
Depois de navegar durante alguns minutos, a plataforma parecia oferecer sobretudo conteúdos educativos. Incluía vídeos que demonstravam experiências simples, como um clip que mostrava o que acontece quando se mergulha um ovo em vinagre, bem como lições de inglês, música e culinária.
O modo infantil da aplicação inclui definições avançadas que permitem aos pais especificar os tipos de conteúdos que preferem que os seus filhos vejam. Estas opções ajudam o algoritmo a adaptar o feed recomendado para utilizadores com menos de 14 anos.
O Cubo fez então o mesmo teste no TikTok. Aí, a sua versão para menores de 14 anos parecia fornecer conteúdos mais recreativos e de entretenimento do que educativos, incluindo danças virais e clips humorísticos, alguns dos quais poderiam ser descritos como "brain rot" - podridão cerebral numa tradução literal da expressão.
No entanto, embora o feed principal "For You" do TikTok não apresente exclusivamente conteúdos educativos, muitos criadores, como @aartemisatworks ou @serialthinker, dedicam as suas contas inteiramente à aprendizagem.
A aplicação também apresenta um modo "TikTok para utilizadores mais jovens", que inclui definições de privacidade mais rigorosas, tempo de ecrã limitado e restrições aos comentários, mensagens e partilhas para utilizadores com menos de 13 anos.
"No entanto, eles podem experimentar o que o TikTok é na sua essência - mostrar a criatividade - enquanto desfrutam de conteúdo selecionado e experimentam os recursos exclusivos, fantasiosos e expressivos do TikTok", diz a aplicação no seu site.
Vale a pena notar que, desde 2024, o TikTok tem oferecido um "feed STEM" - um feed dedicado à ciência, tecnologia, engenharia e matemática e concebido para adolescentes com 13 anos ou mais.
Além disso, no que diz respeito ao "modo adulto", tanto o Douyin como o TikTok apresentam conteúdos semelhantes, que podem ser compostos por qualquer coisa, desde vídeos educativos a vídeos do tipo "brain rot". O Douyin, no entanto, ainda segue as regras gerais de censura impostas pelo governo do presidente Xi Jinping.
A China está a utilizar o TikTok como uma ferramenta de soft power?
A ideia de que a China está a utilizar o TikTok para "emburrecer" os jovens de todo o mundo tem origem, em grande parte, numa entrevista ao 60 Minutes de 2022 com Tristan Harris, cofundador do Centre for Humane Technology.
No programa, Harris descreveu o limite de 40 minutos diários de tempo de ecrã como "quase um reconhecimento de que a tecnologia molda as crianças".
Harris apoiou as suas afirmações com um inquérito de 2019 da Harris Poll a cerca de 3.000 crianças dos EUA, do Reino Unido e da China, que perguntava o que aspiravam ser quando crescessem. Nos EUA, a resposta mais popular foi "influenciador", enquanto na China foi "astronauta".
Desde então, várias figuras políticas fizeram afirmações semelhantes, apontando o dedo ao TikTok e sugerindo que o governo chinês poderia aceder aos dados dos utilizadores ou mesmo espiar os Estados.
Em dezembro de 2022, a Forbes noticiou que vários funcionários do TikTok tinham seguido jornalistas utilizando as ferramentas de geolocalização da aplicação. O TikTok admitiu a irregularidade e despediu os funcionários envolvidos.
A base destas alegações reside na Lei Nacional de Informações da China de 2017, que exige que as empresas chinesas cooperem com os serviços de informações do Estado mediante pedido.
Esta legislação aplica-se às empresas chinesas que operam no estrangeiro. Embora os servidores de dados do TikTok estejam localizados fora da China, a lei poderia, em teoria, estender-se aos dados que a plataforma recolhe.
Em resposta a estas preocupações, a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu proibiram a instalação do TikTok nos dispositivos de trabalho dos funcionários em 2023 para proteger os dados institucionais de potenciais riscos de espionagem.