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Von der Leyen avança com empréstimo de reparação para a Ucrânia, mas Bélgica mantém a oposição

Ursula von der Leyen na quarta-feira.
Ursula von der Leyen na quarta-feira. Direitos de autor  Harry Nakos/Copyright 2025 The AP. All rights reserved.
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De Jorge Liboreiro
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Ursula von der Leyen ofereceu garantias abrangentes para que a Bélgica concorde com um empréstimo de reparação sem precedentes para a Ucrânia. As autoridades belgas afirmam que os riscos podem ser fatais. Os líderes da UE reunir-se-ão a 18 de dezembro para tomar uma decisão final.

A Comissão Europeia vai dar à Bélgica garantias abrangentes para desbloquear um controverso empréstimo de reparação à Ucrânia, afirmou Ursula von der Leyen, avançando com o plano apesar dos riscos considerados "desastrosos" pelas autoridades belgas.

As garantias, delineadas em textos jurídicos apresentados na quarta-feira, consistem em contribuições bilaterais dos Estados-membros, um mecanismo de apoio do orçamento da UE, salvaguardas jurídicas contra retaliações e uma nova proibição de transferência de ativos soberanos de volta para a Rússia.

É a tentativa mais ousada e abrangente da Comissão para ultrapassar a resistência da Bélgica antes de uma cimeira crucial da UE, a 18 de dezembro. A Ucrânia afirmou que necessitaria de uma nova injeção de fundos estrangeiros já na primavera do próximo ano.

"Com as propostas que hoje apresentamos, garantiremos que a Ucrânia dispõe dos meios necessários para se defender e avançar com as negociações de paz numa posição de força", afirmou a presidente da Comissão.

"Propomos a criação de um empréstimo de reparação, utilizando os saldos de caixa dos ativos russos imobilizados na UE, com fortes salvaguardas para os nossos Estados-membros."

O empréstimo de reparação é a opção preferida de von der Leyen para cobrir as necessidades financeiras e militares da Ucrânia nos próximos dois anos, estimadas em 135 mil milhões de euros. A UE deverá contribuir com, pelo menos, 90 mil milhões de euros, sendo o restante suportado por outros aliados ocidentais, entre os quais os Estados Unidos, que já não prestam apoio externo.

Ao abrigo deste regime, ainda não testado, a Comissão canalizaria os ativos imobilizados do Banco Central russo para uma linha de crédito com juros zero para a Ucrânia.

Kiev seria solicitada a reembolsar o empréstimo somente após Moscovo concordar em compensar os danos causados pela sua guerra de agressão — um cenário praticamente impensável.

A maior parte dos ativos, cerca de 185 mil milhões de euros, está depositada na Euroclear, uma central de valores mobiliários em Bruxelas. Isto significa que a Bélgica detém o voto decisivo nas negociações.

Desde o início das discussões, em setembro, a Bélgicatem exigido firmemente garantias de outros Estados-membros, para se proteger da retaliação de Moscovo e evitar perdas de milhares de milhões de euros.

Outra preocupação importante é que as sanções subjacentes aos ativos, que estão sujeitas a renovação por unanimidade, possam ser anuladas pelo veto de um único país. Um levantamento prematuro das restrições libertaria os fundos russos e precipitaria o colapso do empréstimo.

O Banco Central Europeu recusou-se a fornecer um apoio de liquidez de emergência para ajudar os governos a levantar o dinheiro necessário nesse pior cenário.

A resistência inabalável da Bélgica

Mesmo antes de von der Leyen subir ao palco, a Bélgica mostrou-se inflexível.

Na quarta-feira, o ministro belga dos Negócios Estrangeiros, Maxime Prévot, afirmou que o empréstimo de reparação era "a pior" das três opções financeiras disponíveis para apoiar a Ucrânia.

"A nossa porta esteve sempre aberta e continua a estar. No entanto, temos a sensação frustrante de não termos sido ouvidos. As nossas preocupações estão a ser menosprezadas", afirmou Prévot, antes de seguir para uma reunião ministerial da NATO.

As propostas da Comissão "não respondem às nossas preocupações de forma satisfatória. Não é aceitável utilizar o dinheiro e deixar-nos sozinhos a enfrentar os riscos", acrescentou, sugerindo que tinha conhecimento do conteúdo dos documentos jurídicos antes de estes serem tornados públicos pela presidente da Comissão.

Prévot afirmou que, para que o empréstimo avance, o seu país exigirá garantias que "vão além" da Euroclear e da Bélgica, excedendo facilmente os 185 mil milhões de euros em ativos.

"Não estamos a tentar antagonizar os nossos parceiros ou a Ucrânia", afirmou. "Estamos simplesmente a tentar evitar consequências potencialmente desastrosas para um Estado-membro a quem é pedida solidariedade sem que lhe seja oferecida a mesma solidariedade em troca."

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Bélgica, Maxime Prévot, afirmou que o empréstimo de reparação é "a pior" opção
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Bélgica, Maxime Prévot, afirmou que o empréstimo de reparação é "a pior" opção AP Photo

Na sua apresentação, von der Leyen procurou abordar as reservas belgas com garantias mais amplas apoiadas tanto pelos Estados-membros como pelo orçamento da UE, a par de salvaguardas jurídicas para proteger os Estados-membros e instituições financeiras como a Euroclear contra a expropriação ilegal dos seus bens por "jurisdições favoráveis à Rússia".

A perspetiva de expropriação retaliatória foi uma das muitas questões levantadas pelo primeiro-ministro belga Bart De Wever numa carta enviada a von der Leyen na semana passada.

"Infelizmente, estes riscos não são académicos, são reais", afirmou De Wever.

Se não se chegar a um acordo sobre o empréstimo de reparação, a UE recorrerá a empréstimos conjuntos, como fez durante a pandemia de covid-19, disse von der Leyen na quarta-feira.

A emissão ascenderia a cerca de 45 mil milhões de euros só para 2026.

A opção da dívida comum, defendida pela Bélgica, deixaria os ativos russos intocados e evitaria quaisquer armadilhas legais. Mas a ideia tem a oposição da grande maioria dos Estados-membros devido ao impacto imediato que teria nos tesouros nacionais.

De acordo com a Comissão, as duas opções apresentadas na quarta-feira - o empréstimo de reparação e a dívida conjunta - foram concebidas para satisfazer as necessidades de financiamento da Ucrânia de uma forma "flexível e eficaz, independentemente da situação no terreno, quer o país esteja em guerra ou em paz".

O fator Trump

Os ativos russos, paralisados devido às sanções desde o início de 2022, foram incluídos nas negociações iniciadas pelos Estados Unidos para pôr fim à guerra na Ucrânia.

O plano de paz original de 28 pontos, elaborado secretamente por funcionários norte-americanos e russos sem a participação da Europa, incluía uma ideia altamente controversa para empregar os ativos soberanos em veículos de investimento para benefício comercial de Washington e Moscovo.

O modelo causou indignação entre os europeus, que rapidamente se uniram para sublinhar que qualquer decisão sob a sua jurisdição direta seria da sua responsabilidade.

Embora o texto preliminar tenha mudado consideravelmente após várias rondas de negociações entre ucranianos e americanos, o futuro dos ativos continua em aberto.

"As questões mais delicadas e difíceis são sobre territórios e ativos congelados", declarou o presidente Volodymyr Zelenskyy na terça-feira.

"Não posso falar em nome dos líderes europeus sobre o dinheiro congelado na Europa. Só posso partilhar a minha opinião, e eles podem apoiar-me", acrescentou.

"O que importa é que tudo seja justo e transparente. Que não existam jogos nas costas da Ucrânia."

Von der Leyen prometeu satisfazer as necessidades militares e financeiras da Ucrânia
Von der Leyen prometeu satisfazer as necessidades militares e financeiras da Ucrânia Omar Havana/AP

Na sua carta contundente a von der Leyen, De Wever advertiu que avançar com o empréstimo de reparação nesta fase "teria, como dano colateral, que nós, como UE, estaríamos efetivamente a impedir a conclusão de um eventual acordo de paz".

De Wever referiu que é "muito provável" que a Rússia não seja declarada a "parte vencida" e que, por conseguinte, tenha direito a recuperar os seus bens soberanos ao abrigo das sanções da UE.

"A Ucrânia não poderá nem estará disposta a devolver os empréstimos que lhe foram concedidos com base nos ativos soberanos russos, pelo que parece certo que o contribuinte europeu será novamente chamado a contribuir", acrescentou.

As observações de De Wever sobre as negociações de paz foram apelidadas de inadequadas por funcionários e diplomatas da UE, considerando que estas minavam a unidade europeia em relação a Moscovo.

Na quarta-feira, von der Leyen tentou contrariar as afirmações de De Wever.

"Estamos a aumentar o custo da guerra de agressão da Rússia. E isso deve funcionar como um incentivo adicional para que a Rússia se empenhe na mesa das negociações", afirmou.

Os embaixadores iniciarão as discussões sobre os textos jurídicos ainda esta quarta-feira, após a apresentação prevista de von der Leyen. O objetivo é chegar a um acordo quando os líderes da UE se reunirem em meados de dezembro para uma cimeira decisiva, o que representa um prazo muito apertado.

A aumentar a pressão está ainda um programa de 8,1 mil milhões de dólares que o Fundo Monetário Internacional (FMI) pretende conceder à Ucrânia. Para que o FMI tome uma decisão final, será necessário um compromisso firme dos aliados europeus para garantir a estabilidade macroeconómica de Kiev.

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