A razão por que o oleoduto de Druzhba é excluído do embargo europeu ao petróleo russo

Tanques de armazenamento de petróleo no oleoduto de Druzhba na cidade bielorrussa de Mozyr, cerca de 300 km a sudeste de Minsk.   – Copyright: Sergei Grits/AP
Tanques de armazenamento de petróleo no oleoduto de Druzhba na cidade bielorrussa de Mozyr, cerca de 300 km a sudeste de Minsk. – Copyright: Sergei Grits/AP Direitos de autor AP Photo
De  Jorge LiboreiroEuronews
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Hungria, Chéquia e Eslováquia conseguem isenção do petróleo transportado pelo oleoduto por tempo indeterminado.

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Depois das várias sanções impostas pela Europa não terem sido suficientes para pôr fim à guerra na Ucrânia, os 27 estados-membros da União Europeia (UE) chegaram a acordo para proibir as importações de petróleo russo, tanto de crude como de produtos petrolíferos refinados, até ao final do ano.

Ao fim de quatro semanas de negociações, o acordo atingido na cimeira estraordinária em Bruxelas, que terá repercussões a nível global, inclui uma importante alteração à proposta inicial de embargo total avançada pela Comissão Europeia há quase um mês: a isenção do petróleo importado por via terrestre, através de oleodutos.

O embargo deverá aplicar-se somente às importações de petróleo extraído nas plataformas marítimas, que representam mais de dois terços das importações diárias de petróleo russo da UE, e não ao importado por via terrestre.

A exclusão do petróleo importado através de oleodutos era fortemente defendida pela Hungria e outros estados-membros sem acesso ao mar, que exigiam um período alargado de dois anos, até dezembro de 2024, para a implementação do embargo.

Mas na versão final do acordo alcançado em Bruxelas, a isenção do petróleo importado através de oleodutos, apesar de temporária, irá aplicar-se por um período de tempo indefinido.

O acordo é uma vitória política incontestável para o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán. "O povo húngaro vai conseguir dormir esta noite", declarou o primeiro-ministro no final da cimeira. "A proposta de Bruxelas seria uma bomba nuclear lançada sobre a economia húngara, mas conseguimos evitá-la" acrescentou.

Um legado soviético duradouro

O pomo de discórdia é o oleoduto Druzhba, um enorme conduto que remonta à era soviética e é atualmente operado pela estatal russa Transneft.

O oleoduto, cujo nome significa "amizade", começou a ser construído no início dos anos 60 e tem uma extensão de 5.500 quilómetros, abastecendo refinarias na Polónia, Alemanha, Hungria, Eslováquia e Chéquia com petróleo dos Urais.

Entre 750.000 e 800.000 barris de petróleo são diariamente transportados através do oleoduto, cuja capacidade diária pode atingir até 1,4 milhões de barris. O combustível é depois refinado por empresas da UE e usado na produção de diesel, nafta, gasolina, lubrificantes e outros produtos, que são vendidos dentro e fora do espaço europeu.

O oleoduto tem um papel fundamental para a Europa Central, largamente dependente do petróleo russo.

Quando a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, propôs a eliminação total gradual das importações de petróleo por via marítima e através de oleodutos, as reações não tardaram.

A Hungria, Chéquia e Eslováquia, três países que não têm acesso ao mar e dependem fortemente do petróleo russo, expressaram preocupações e exigiram um período alargado de entre dois a quatro anos para a implementação da medida.

O governo eslovaco argumentou que a única refinaria do país, a Slovnaft, utiliza exclusivamente petróleo russo e que a reposição da tecnologia de refinação levaria cinco anos e exigiria 250 milhões de euros. O governo húngaro afirmou que a restruturação do sector exigiria 550 milhões de euros e a Chéquia pediu para que a medida entrasse em vigor em junho de 2024, data prevista para a ligação do país ao oleoduto transalpino.

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O oleoduto de Druzhba abastece várias refinarias de petróleo em toda a União Europeia.Euronews

As discussões nos bastidores envolveram questões técnicas complexas, como fornecedores e rotas comerciais alternativas, bem como a possibilidade de uma eventual recessão económica com custos políticos para os estados-membros.

Cientes da gravidade da situação criada pela guerra na Ucrânia e da importância da unidade frente à Rússia, os líderes europeus alcançaram um acordo para o embargo que, apesar da cedência relativa à isenção, é notável.

Até ao início da guerra , a UE importava cerca de 3,5 milhões de barris de petróleo russo por dia, no valor de 74 mil milhões de euros (dados de 2021). O aumento dos preços da energia tornaram imperativo o embargo: graças à venda de combustíveis fósseis, a Rússia conseguiu valorizar o rublo e alcançar um excedente comercial de 90 mil milhões de euros.

"Apesar da isenção, o embargo é um passo extremamente positivo para a Europa e mostra que a UE está determinada a punir Vladimir Putin pelas atrocidades cometidas na Ucrânia", afirmou Anna Krajinska, engenheira na Transport & Environment, uma organização que promove a mobilidade ecológica.

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A igualdade de tratamento dos estados-membros

A Hungria, Eslováquia e e Chéquia elogiaram o acordo e expressaram satisfação com a forma como as suas propostas foram tidas em consideração.

A Polónia e a Alemanha, que estão ligadas à extensão norte do oleoduto Druzhba, prometeram ir para além das obrigações legais estipuladas no acordo e pôr também fim, de forma gradual, às importações de petróleo através de oleodutos.

Segundo estimativas da Comissão Europeia , se ambos cumprirem a promessa, o bloco comunitário comprará menos 90% do petróleo russo até ao fim do ano.

Mas o destino dos restantes 10%, que fluem pelo ramo sul do oleoduto Druzhba, é incerto.

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O primeiro-ministro holandês e o primeiro-ministro belga sugeriram uma re-avaliação da isenção nos próximos meses, com vista a diminuir a sua duração, mas é pouco provável que a Hungria esteja disposta a alterar o compromisso.

Vários países da UE consideram que a criação de um regime de exeção para certos Estados Membros é uma "ameaça às regras da concorrência." A exclusão do oleoduto Druzhba levanta questões práticas de desigualdade, dado que um pequeno grupo de estados-membros continua a ter acesso ao combustível enquanto a maioria terá de encontrar alternativas.

"Esses países terão uma vantagem competitiva que põe em causa a integridade do mercado único," explicou, em entrevista à Euronews, Ben McWilliams, analista do centro de pesquisa Bruegel. "Não é claro até que ponto a Hungria e outros países poderão refinar o crude russo e vendê-lo em mercados secundários - isso deve ser limitado e monitorizado," acrescentou.

As conclusões da cimeira incluem uma promessa vaga de garantia da igualdade de tratamento dos estados membros mas essa igualdade ficará mais clara no fim de dezembro.

O facto de o petróleo russo ser vendido com um desconto de 35 dólares em relação ao Brent torna a coisas mais difíceis para a Europa e poderá gerar especulação por parte de fornecedores alternativos.

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O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, garantiu ainda uma cláusula no acordo, segundo a qual "em caso de interrupções repentinas de fornecimento, serão introduzidas medidas de emergência para assegurar a continuidade do mesmo." A disposição foi sugerida depois de as autoridades ucranianas advertirem que "algo poderia acontecer" ao segmento do oleoduto Druzhba que atravessa a Ucrânia.

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