Um grupo de Estados-membros da União Europeia (UE) bloqueou, sexta-feira, o texto da nova diretiva para melhorar as condições dos trabalhadores das plataformas digitais, deixando a legislação num limbo.
A diretiva foi bloqueada numa ronda negocial dos representantes permanentes dos Estados-membros, sexta-feira, que visava afinar o texto após um acordo preliminar entre o Conselho da UE (ministros dos 27 Estados-membros) e o Parlamento Europeu, na semana passada. O voto contra da França, seguido de abstenções de outros países, incluindo da Alemanha, criou o novo bloqueio.
Não é de esperar que seja obtido consenso até às eleições europeias de junho, pelo que a diretiva fica num limbo legislativo. Na votação de dezembro passado, opuserem-se nove Estados-membros, tendo o dossiê passado da presidência espanhola da UE para a belga, mas a esta mediação também não chegou a bom porto.
"Acreditamos que esta diretiva, que pretende ser um importante passo em frente para esta força de trabalho, percorreu um longo caminho. Vamos agora considerar os próximos passos", disse a presidência belga, num post no X.
Apresentada pela primeira vez em 2021, a diretiva destina-se a melhorar as condições de trabalho das pessoas que prestam serviços através das plataformas digitais, tais como a Uber, a Deliveroo e a Glovo.
Habitualmente contratados como trabalhadores independentes, estes profissionais estão, muitas vezes, sujeitos a regras semelhantes às dos trabalhadores por conta de outrém. Esse facto levou a inúmeros processos judiciais em vários países, pelo que a Comissão Europeia apresentou uma proposta ser aplicada pelos 27 Estados-membros.
A peça central da diretiva é um novo sistema de presunção legal, que reajustaria o estatuto dos trabalhadores das plataformas, se estes cumprirem um certo número de critérios, ou indicadores, nas suas atividades diárias, tais como terem regime de exclusividade e obrigação de cumprir normas relativas à aparência, conduta e desempenho.
O executivo comunitário estima que cerca de 5,5 milhões dos 28 milhões de trabalhadores das plataformas digitais em atividade na UE estão mal classificados e seriam, portanto, abrangidos pela presunção legal.
A lei prevê que os trabalhadores das plataformas que cumprem os critérios passem a usufruir de direitos tais como o salário mínimo, a negociação coletiva, a limitação do tempo de trabalho, o seguro de saúde, as baixas por doença, o subsídio de desemprego e as pensões de reforma.
Parlamento Europeu tentou aumentar garantias
Desde a apresentação da diretiva, a presunção legal tem estado sob intenso escrutínio, não só por parte das próprias plataformas, que receiam um aumento dos custos para acomodar o estatuto atualizado mas, também, por parte de alguns governos, receosos de aumentar a carga administrativa e de abrandar a chamada "Gig Economy".
Os governos dos Estados-membros passaram meses a tentar fazer convergir os seus pontos de vista díspares até chegarem a acordo sobre um mandato comum, em junho do ano passado. Para tal, acrescentaram uma disposição que concede às autoridades nacionais a "discricionariedade de não aplicar a presunção" em determinados casos.
O Parlamento Europeu, pelo contrário, optou por uma posição maximalista e favorável aos trabalhadores, por forma a tornar mais difícil para as plataformas contornarem a presunção legal e reforçou os requisitos de transparência dos algorítmos, aumentando as sanções em caso de incumprimento.
Em dezembro, uma coligação de países, incluindo a França, a Chéquia, a Irlanda, a Grécia, a Finlândia, a Suécia e os três Estados bálticos, deixou claro que não podiam apoiar o novo texto.
A presidência belga esforçou-se por salvar a diretiva antes que fosse demasiado tarde e redigiu um novo compromisso para que todos os 27 aderissem. Este novo texto foi utilizado nas negociações de janeiro, que fracassaram porque o Parlamento e o Conselho continuavam demasiado afastados.
O mandato foi novamente revisto, mas enfrentou novas resistências. Ainda assim, a Bélgica conseguiu obter luz verde para uma nova ronda de negociações, na qual participou, na semana passada, Pierre-Yves Dermagne, ministro da Economia e do Emprego do país.
Desta vez, porém, os negociadores foram bem sucedidos e chegaram a um acordo renovado, que proíbe as plataformas de despedir trabalhadores com base em decisões automatizadas.
Este acordo foi colocado na mesa dos embaixadores, na sexta-feira à tarde, para um acompanhamento político, mas foi rejeitado.
Antes da votação, o grupo Socialistas e Democratas (S&D) do Parlamento Europeu apontou três líderes como os principais bloqueadores: Emmanuel Macron, presidente da França, Kyriakos Mitsotakis, primeiro-ministro da Grécia, e Kaja Kallas, primeira-ministra da Estónia.