Apesar de ter assinado, há cerca de dois meses, um tratado de cooperação com o Irão em áreas como energia e defesa, a Rússia ainda não manifestou a sua intenção de intervir em nome do seu aliado no confronto com Israel, perante a possibilidade de os Estados Unidos entrarem na guerra.
Ainda há dúvidas sobre o que acontecerá se a batalha entre Teerão e Telavive ficar fora de controlo, especialmente depois de o Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita ter afirmado, na segunda-feira, que o regime iraniano se tornou uma ameaça global, capaz de enviar mísseis para a Europa. Há quem se interrogue sobre o papel de Moscovo em tudo isto, sobre a sua vontade de ajudar Teerão, ou se o presidente russo Vladimir Putin está a "pescar em águas turvas", como alguns sugerem, especialmente porque as suas declarações ainda são tímidas.
Em declarações à CBS, na terça-feira, o presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, que regressou a Washington com urgência, não para um cessar-fogo entre as duas partes, mas "para um objetivo muito maior", deixou claro que não viu até agora qualquer prova de que a Rússia ou a Coreia do Norte estejam envolvidas na ajuda ao Irão.
Como é que o Kremlin reagiu ao confronto aceso?
Inicialmente, Putin tentou equilibrar as suas posições, condenando as "violações da Carta das Nações Unidas e do direito internacional" por parte de Israel, mas ficou por aí, evitando um confronto direto.
Com a escalada do conflito, o Kremlin capitalizou a sua posição de mediador, mantendo-se fiel à sua proposta de "disponibilidade para eliminar o excedente nuclear do Irão", mas só foi bem recebido por Trump, em quem tinha apostado.
Enquanto alguns descrevem a relação entre a Rússia e o Irão como uma poderosa "aliança", outros argumentam que não se trata de um nível tradicional, mas sim de uma "cooperação estratégica" baseada numa visão partilhada de um mundo multipolar.
Andrei Rudenko, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, foi muito direto: "A assinatura do tratado em abril passado não significa o estabelecimento de uma aliança militar com o Irão ou a prestação de assistência militar mútua".
No entanto, é discutível, segundo vários observadores, até que ponto Moscovo está disposto a defender o seu parceiro, em comparação com o seu recente desempenho na Síria, que levou à queda do regime de Bashar al-Assad.
Por um lado, um golpe de Estado em Teerão poderia privar a Rússia de um parceiro estratégico importante, tanto mais que o novo regime, qualquer que seja a sua natureza, liberal, laico ou conservador, não será necessariamente tão amigável como o atual.
Por outro lado, há quem acredite que Moscovo pode encontrar a sua oportunidade na continuação do conflito, sobretudo com a subida do preço do petróleo russo dos Urais, que ultrapassou os 60 dólares, excedendo o limite de preço imposto pelos sete países, reavivando assim a sua tesouraria e aliviando o impacto das sanções e pressões ocidentais.
Além disso, a guerra pode tornar a China, que consome diariamente cerca de 1,8 milhões de barris de petróleo iraniano, mais dependente da Rússia, que ainda precisa desesperadamente de uma medida dos EUA para desviar os sistemas de defesa antimíssil para as suas bases no Médio Oriente e dos seus aliados Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Catar, reforçando assim a sua influência na região.
O que pode a Rússia fazer pelo Irão?
Até à data, os jornais russos têm tentado abordar a questão com cautela, promovendo o Kremlin como mediador ideal para resolver o conflito, mas há quem acredite que o sucesso diplomático está longe, especialmente porque a credibilidade de Putin junto dos seus aliados foi afetada depois de ter recuado no apoio ao regime de Bashar al-Assad no ano passado, numa altura em que o IRGC e o Hezbollah se preparavam para apoiar o exército sírio.
Há quem defenda que a Rússia só pode apoiar o Irão "no Conselho de Segurança da ONU, mas não há compromissos militares que a vinculem". A Rússia já não "precisa do Irão para fabricar os drones de que necessita para a guerra contra a Ucrânia", uma vez que é agora capaz de produzir cerca de 2700 drones por mês sem o apoio de Teerão.