As preocupações de Bruxelas confirmaram-se e o partido SMER, crítico da União Europeia (UE) e cada vez mais pró-russo, ganhou as eleições legislativas, domingo, na Eslováquia. O líder Robert Fico já esteve à frente de um governo pró-UE, por três mandatos mas, entretanto, adotou um tom nacionalista.
Robert Fico era visto como um valor seguro na obtenção de consensos no bloco, mas o ex-primeiro-ministro foi alterando o seu discurso para um tom mais populista e muito crítico da política externa da UE, sobretudo no que diz respeito à guerra na Ucrânia, para onde não quer enviar armas.
Com apenas 23% dos votos, o líder terá de formar um governo de coligação e se conseguir poderá ser uma "dor de cabeça" para a UE, dise Alena Kudzko, analista no centro de estudos eslovaco GLOBSEC: "Se Robert Fico tenciona cumprir as suas promessas de campanha pré-eleitoral, isso significará muito provavelmente que será mais difícil para a União Europeia chegar a um compromisso a nível comunitário".
"Não significa que Robert Fico esteja disposto a bloquear todas as decisões relativas à Ucrânia e à Rússia, mas poderá ser um negociador muito mais duro e querer ter mais concessões para a Eslováquia ou o seu governo, em troca do apoio às decisões de política externa com as quais não concorda", acrescentou a analista, em declarações à euronews.
A sombra da corrupção
Robert Fico demitiu-se do governo em 2018, face a grandes protestos após o assassínio do jornalista de investigação Jan Kuciak e da sua noiva.
O jornalista denunciava casos de corrupção e houve uma série de investigações oficiais nessa área depois da demissão de Fico, mas este nunca foi indiciado, até por gozava de de imunidade parlamentar.
"O seu último governo estava cheio de corrupção e o seu partido esteve envolvido no assassínio do jornalista de investigação Jan Kuciak", disse Jaromir Novak, correspondente para assuntos europeus para a agência noticiosa eslovaca, em Bruxelas.
"Durante esse período, pelo menos 40 pessoas da sua equipa política, da polícia, dos serviços secretos e dos oligarcas foram para a prisão ou estão a enfrentar a justiça. Portanto, é claro que ele quer proteger-se a si próprio e aos seus aliados", acrescentou Novak, à euronews.
A Eslováquia é um país profundamente polarizado, segundo os analistas e para muitos dos nacionais que vivem em Bruxelas, o resultado das eleições foi dececionante.
"Tínhamos esperanças de que o velho sistema que vemos na Eslováquia, o sistema dos oligarcas, das mentiras, da desinformação, da disseminação do ódio, acabasse finalmente. Havia alguma esperança", afirmou Erik Zolcer, ativista na plataforma de cidadãos "De Tatra a Schumann".
"Não tenho dúvidas de que a Eslováquia irá progredir gradualmente nesse sentido, mas infelizmente ainda não é o momento. E foi uma grande deceção ver que isso não aconteceu nesta votação", acrescentou.
Negociações para governar "para todos"
A presidente da Eslováquia, Zuzana Caputova, sublinhou que o novo executivo teria de ser "um governo que servirá todos os cidadãos", numa alocução televisiva à nação, esta segunda-feira.
Fico tem atacado repetidamente a presidente, que é liberal, acusando-a de ser uma agente norte-americana e de servir interesses estrangeiros. Caputova abriu um processo judicial contra Fico.
Robert Fico quer formar um governo nacionalista e poderá obter o apoio dos ultranacionalistas, mas precisa, sobretudo, da força política mais moderada que é uma cisão do Smer, e que teve 14% dos votos. Denominado Hlas (Voz), de centro-esquerda, esse partido é liderado pelo ex-primeiro-ministro Peter Pellegrini.
Outros potenciais parceiros de coligação incluem o ultranacionalista Partido Nacional Eslovaco, um grupo claramente pró-russo, que obteve 10 lugares, e os conservadores Democratas de Christion, com 12 lugares.
Um recém-chegado liberal e pró-ocidental, o Partido Progressista da Eslováquia, ficou em segundo lugar nas eleições, com 18% dos votos, ou seja, 32 lugares. O seu líder, Michal Simecka, disse que gostaria de tentar formar uma coligação governamental se Fico falhar.
Os críticos de Fico receiam que o seu regresso ao poder possa levar a Eslováquia a abandonar o seu rumo pró-europeu, seguindo o caminho de governos ultranacionalistas e muito críticos da UE tais como o da Hungria, de Viktor Orbán, e da Polónia, de Mateusz Morawiecki.