Wa Lone, de 33 anos, e Kyaw Soe Oo, de 29, foram incluídos num indulto coletivo do Presidente Win Mynt a mais de 6500 presos, mas será suficiente para abafar as crescentes críticas ao país?
Os dois jornalistas da Reuters condenados a sete anos de prisão em Myanmar por alegada violação de segredos do Estado foram libertados esta terça-feira e já puderam rever as respetivas famílias, sobretudo os filhos, de quem estiveram separados quase um ano e meio.
Wa Lone, de 33 anos, e Kyaw Soe Oo, de 29, foram detidos a 12 de dezembro de 2017, no exterior de um restaurante em Yangon, quando andavam a investigar o suposto massacre nesse mesmo ano de 10 membros da minoria islâmica Roinghya por forças de segurança e civis budistas no estado de Rakhine, no ocidente da antiga Birmânia.
Os dois jornalistas acabaram mesmo condenados em setembro último, após um julgamento que motivou críticas da comunidade internacional e inclusive um apelo do Secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, para a libertação dos jornalistas.
Os advogados de defesa alegaram que a detenção e a condenação fizeram parte de um esquema com o simples objetivo de silenciar os dois jornalistas num caso que vinha a colocar os holofotes de forma negativa sobre Myanmar: a repressão sobre a minoria Roinghya.
O caso levantou muitas dúvidas sobre o processo democrático em curso no país e levantou muitas vozes críticas por parte de diversos líderes internacionais e de organismos de defesa dos direitos humanos.
Um primeiro recurso apresentado pela defesa dos jornalistas foi rejeitado em janeiro por um congénere de Myanmar ao tribunal da Relação em Portugal. A condenação foi, então, reconfirmada.
Um derradeiro recurso para o Supremo Tribunal foi também rejeitado já no final de abril. Mas agora um indulto concedido pelo Presidente do Myanmar, Win Myint, a mais de 6500 presos incluiu também os dois jornalistas.
A libertação foi seguida em direto e muito celebrada na redação da Reuters em Singapura, de onde nos chegaram imagens do momento.
À porta da prisão de onde foram libertados, Wa Lone falou aos jornalistas que o aguardavam e agradeceu "muito" a quem pediu a libertação de ambos nos últimos meses, tanto "dentro da prisão" como "um pouco por todo o mundo."
"Estou muito feliz por poder voltar a ver a minha família e os meus colegas. Quero voltar à minha redação", expressou o mais velho dos dois jornalistas condenados e agora perdoados em Myanmar.
À pergunta sobre o futuro, Wa Lone respondeu de pronto: "sou jornalista e vou continuar a sê-lo."
Wa Lone e Kyaw Soe Oo passaram mais de 500 dias atrás das grades. Desde a primeira hora, declaram-se inocentes e foram sempre defendidos pela agência para a qual trabalham, a Reuters.
Durante o tempo em que estiveram na prisão em Myanmar, o trabalho realizado sobre as operações militares realizadas contra a minoria Roinghya na antiga Birmânia foi alvo de várias distinções incluindo a mais alta distinção na categoria de jornalismo, o prémio Pulitzer.
A violenta repressão sobre os Roinghya, em particular no estado de Rakhine, levou à fuga de mais de 700 mil membros desta minoria muçulmana para o Bangladesh.
As operações de repressão sobre uma minoria a quem é negada o direito de cidadania e posse de bens incluem assassínios impunes, violação de mulheres e inclusive, garantem alguns relatos locais, a imolação de bebés vivos.
Na tentativa de abafar os relatos das atrocidades cometidas, as autoridades viraram-se contra os jornalistas e o caso dos dois elementos afetos à Reuters inflamou ainda mais as críticas internacionais à postura do governo birmanês e da Prémio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi.