África do Sul levanta ação por genocídio contra Israel. O que esperar do Tribunal de Haia?

Palestinianos choram os familiares mortos nos bombardeamentos israelitas na Faixa de Gaza, à porta de uma morgue em Khan Younis, no domingo, 24 de dezembro de 2023.
Palestinianos choram os familiares mortos nos bombardeamentos israelitas na Faixa de Gaza, à porta de uma morgue em Khan Younis, no domingo, 24 de dezembro de 2023. Direitos de autor AP Photo/Mohammed Dahman
Direitos de autor AP Photo/Mohammed Dahman
De  Giulia Carbonaro
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
Copiar/colar o link embed do vídeo:Copy to clipboardCopied
Artigo publicado originalmente em inglês

O caso de genocídio da África do Sul contra Israel vai começar a ser ouvido esta semana no Tribunal Internacional de Justiça em Haia - o que é que vai ser discutido?

PUBLICIDADE

O Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) realiza esta semana as primeiras audiências no processo de genocídio movido contra Israel pela África do Sul, que exige ao governo de Netanyahu que pare as operações de combate em Gaza.

A audiência agendada para 11 e 12 de janeiro é muito importante para Israel, que pela primeira vez, após décadas de boicote a este órgão jurisdicional da ONU, aceitou defender-se perante 15 juízes eleitos em Haia.

Qual é o objetivo do processo?

A África do Sul apresentou o caso ao TIJ, no final de dezembro, alegando que Israel se tinha envolvido em "atos genocidas" em Gaza durante a guerra declarada contra o Hamas, e pedindo que o tribunal aprovasse uma medida provisória que obrigue as forças de defesa israelitas a cessar todas as operações militares que têm sido mortíferas naquela região.

Segundo o país africano, Israel terá violado as suas obrigações no âmbito da Convenção sobre o Genocídio. O documento de 84 páginas apresentado pela África do Sul acusa Israel de cometer atos em Gaza que são "de carácter genocida porque se destinam a provocar a destruição de uma parte substancial do grupo nacional, racial e étnico palestiniano".

Mais de 22.000 palestinianos - na sua maioria mulheres e crianças - foram mortos em ataques israelitas desde o início do conflito, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza. A guerra foi desencadeada pelo ataque do Hamas contra Israel a 7 de outubro, que matou 1200 pessoas, na sua maioria civis.

Israel negou a acusação da África do Sul "com repugnância", classificando-a como "sem fundamento" e anunciando que se defenderá em tribunal - uma decisão que tornará mais difícil para o governo israelita afastar qualquer possível condenação.

Como é que Israel se vai defender?

O processo sul-africano alega que a intenção genocida necessária - que é uma caraterística muito particular para que o crime de genocídio seja provado - neste caso específico "pode ser apoiada pelo padrão de conduta dos militares israelitas, mas também por várias declarações públicas dadas por vários representantes e funcionários israelitas", disse, à Euronews, Maria Varaki, professora de Direito Internacional no Departamento de Estudos de Guerra do King's College de Londres.

Mas este é o aspeto que Israel provavelmente irá contestar, de acordo com Alonso Gurmendi Dunkelberg, professor de Relações Internacionais no King's College.

"No caso do genocídio, é necessário que o crime tenha sido cometido com a intenção específica de destruir um grupo enquanto tal, ou seja, destruir um grupo por ser esse grupo", disse à Euronews.

"E essa é a parte mais complicada e onde espero que a defesa de Israel se concentre. Ou argumenta que não cometeu o ato em si ou argumenta que não criou condições que tornem Gaza inabitável, sublinhando que deixou passar camiões que transportavam ajuda.

Israeli soldiers stand outside Shifa Hospital in Gaza City, Nov. 22, 2023.
Israeli soldiers stand outside Shifa Hospital in Gaza City, Nov. 22, 2023.AP Photo/Victor R. Caivano, File

Quanto tempo demorará o TIJ a tomar uma decisão?

A audiência de 11 e 12 de janeiro ainda não irá considerar os méritos do caso de genocídio contra Israel, mas apenas decidir sobre as medidas provisórias pedidas pela África do Sul com carácter de urgência. De acordo com os especialistas, esta última decisão poderá ser tomada entre duas semanas e um ou dois meses após a audiência.

"Se o tribunal seguir o que fez nos casos anteriores da Gâmbia contra Myanmar ou da Ucrânia contra a Rússia - que invocaram ambos a Convenção sobre o Genocídio - espero que, dentro de duas semanas, o tribunal conceda a ordem provisória [pedida pela África do Sul]", disse Varaki.

Quanto aos méritos do caso de genocídio, disse Gurmendi, poderá "levar vários anos" até que o tribunal chegue a um veredito.

O que é que uma condenação significaria para Israel?

O TIJ - o principal órgão judicial das Nações Unidas - não tem poderes para instaurar processos, embora as suas decisões tenham um certo peso na comunidade internacional. Uma condenação por genocídio tem um impacto enorme na posição de um país no panorama internacional.

"A Convenção sobre o genocídio trata do crime dos crimes. É por isso que muitas pessoas querem essa condenação", disse Varaki. "Não estou a falar apenas do caso atual. De um modo geral, eles querem uma condenação porque pensam que esta é a pior condenação de sempre."

Embora Israel tenha a obrigação legal de dar seguimento à eventual aprovação pelo TIJ da medida provisória exigida pela África do Sul, Gurmendi Dunkelberg disse que há precedentes de casos de não cumprimento, incluindo os EUA.

"O problema é que, [em termos de] aplicação da lei, não existe uma polícia internacional que bata à porta e diga 'Está a violar uma ordem de um juiz, vou prendê-lo por desrespeito ao tribunal ou algo do género'. Por isso, na verdade, depende do que os outros Estados podem e fazem", afirmou.

"Supondo que Israel não cumpre a ordem - o que não é garantido, pode simplesmente cumpri-la - então os outros Estados poderão pressionar os israelitas [a fazê-lo]".

PUBLICIDADE

Uma condenação poderia enfraquecer o apoio dos aliados ocidentais à guerra de Israel em Gaza.

Partilhe esta notíciaComentários

Notícias relacionadas

Ataques israelitas matam 13 pessoas em Rafah. Palestinianos começam a fugir da zona

Pimeiro-ministro israelita reitera que a guerra vai continuar e deixa aviso ao Hezbollah

Homem que afirma ser ex-oficial russo quer testemunhar sobre crimes de guerra na Ucrânia